Estávamos em férias ... continuação 9a. carta "Campeão de visitas no 11o. andar"
Assim que chegamos em SP fomos recebidos por um jovem casal e ficamos uns trinta dias hospedados no apartamento deles. Um casal jovem, que tinham se mudado há pouco tempo para esse prédio.
Tentamos tomar muito cuidado para não atrapalhar a rotina deles. E eles nos deixaram tão a vontade na casa, que ter um lugar para ficar, assim ... com tanto carinho e amor, pudemos nos sentir abrigados, acolhidos. Muito obrigada Ju e Fer.
Saíamos de manha e voltávamos a noite. Quando as visitas ficavam suspensas a gente voltava mais cedo ou saia de casa mais tarde. Viram? Eu disse, saiamos de casa. E a gente podia se sentir em casa mesmo. Gratos Ju e Fer.
Pudemos usar o carro da família inúmeras vezes para ir até o hospital, pois nessa época era muito perigoso sairmos de ônibus e metrô em SP com a condição que meu marido estava, usando colete no pescoço, e órteses no braço esquerdo. Gratos Ju e Fer.
Conseguimos fazer acompanhamento das cirurgias que meu marido fez no PR e assim fez novo procedimento para retirar as peças de metal que foram fixadas nos ossos. Nessa oportunidade, ficou internado no hospital e liberado dias depois. A recuperação do meu marido estava excelente, graças a Deus.
O 11º. andar me deixava ociosa. Eu não podia ficar o todo com meu filho. Eu precisava fazer algo, tentei ler algumas coisas, saia para caminhar na rua. Adoro pintar tecidos, mas era inviável. Não agüentava ficar o tempo todo sem uma atividade. Rezava. Lia. Conversava. Daí a minha irmã me deu a idéia de fazer algo com linha, agulhas. Andei por perto e nada encontrei. Resolvi ir na rua 25 de março comprar aviamentos. Comecei a fazer bicos de crochê na sala da UTI. Foi uma atividade muito boa para mim.
Na sala de espera da UTI fizemos amizades com as demais famílias e acompanhantes na sala de espera da UTI. Oh, meu Deus! Quantas situações inesperadas! Quantos imprevistos da vida! Quantos acidentes! Quantas doenças! Em meio a tanta dor, saudade, expectativas, pessoas incríveis e pessoas vazias.
Dentre as incríveis tive o prazer e honra de conhecer duas mulheres que acompanhavam seus maridos na UTI, uma japonesa com uma fé viva, que batalhava pela vida do companheiro. Era uma pessoa resolvida e ética. Depois a batalha dela voltou-se para dar qualidade de vida ao seu companheiro. E conseguiu levá-lo para um Home Care instalado em uma casa de repouso, próximo a SP. E ficou com ele até o último instante. Está prosseguindo com sua vida, em busca de objetivos antes esquecidos. Não é uma mulher de fibra?
A outra uma senhorinha miúda, idosinha de cabelos brancos, que resolvia tudo sozinha para ajudar seu maridinho. A coisa mais fofa que vi naqueles dias. Era uma demonstração de amor, carinho, principalmente de respeito pelo ser humano, que era seu marido. Era o exemplo de pessoa independente, que cumpria as responsabilidades outrora assumidas perante seu companheiro. São Paulo era São Paulo. Não estávamos em uma cidade pequena. Nada cobrava da família. Preferia vir, de manhã, de táxi. Sentava na UTI. Entrava na visita. Almoçava ali por perto. Voltava no horário de visita. No final do dia, chamava um táxi e ia para casa. Ela tinha uns 80 anos. Olha que saúde, que disposição, que compromisso. Essa rotina não era uma semana. Foram meses. Ela não é fantástica? Quando deixou o hospital, sem o seu maridinho, ela se despediu, trocamos telefone e ela me disse que gostaria de manter a amizade que fizemos em um momento tão difícil em nossas vidas. Na despedida me falou que iria rezar muito pelo Róger. E que ia ser difícil olhar a cadeira do “papai” vazia. Dias mais tarde, voltamos a conversar e ela estava bem. Tinha alterado algumas coisas em casa. Mas, a saudade era grande.
Recebemos muitas visitas. Parentes, amigos nossos e do Róger foram nos visitar em SP. Era cada surpresa! E que sensação gostosa! Sensação de ser amados.
Róger recebeu o apelido de “Campeão de Visitas” no hospital. Obrigada Deus.