Brasília, 24 de agosto de 2012
Caríssimo dr. Lemes,
Mui gentis e generosas palavras de um mestre a um ex discípulo. Honrado, agradeço-lhe pela especial deferência com que me apraz sua atenção. Fui eu que me vesti do seu 'lábaro', aqui num ousado trocadilho ao parodiar Castro Alves, a quem aludo por sabê-lo um dos seus favoritos. Para mim, e, sem o sacrilégio de a ele comparar-me, lembro-me só do que escreveu José de Alencar a Machado de Assis, apresentando a este o jovem poeta baiano, em carta que se tornou histórica.
É de literatura que falamos. Mas esta o tem em longo e iluminado caminho percorrido pela ciência jurídica e suas letras. E sabemos que nenhuma ciência está tão intimamente ligada à literatura como a jurídica. Há uma paixão a envolver e unir quem lida com uma à outra. Aqui, o discípulo traz ao vão da memória o que os “suspiros poéticos”, com os quais ilustrava os autos de penal II. Ali referia-se, entre outros doutrinadores, a um Tobias Barreto, um Clovis Beviláqua e, claro, às Espumas Flutuantes do genial poeta. Isto sem que de mim se apague os lampejos de Goethe, a quem me ensinou a ler. Já antes, eu me ligava aos seus filhos no Colégio Marista, assim como o Sr e meu pai, lá pelos “dourados” anos 60.
Quando visitei Olinda, senti a emoção de estar na mesma escola pela qual passaram esses gênios. Lembrei-me do mestre que me encantou e certa vez elogiou-me uma peça. Era um Recurso de Apelação, num júri simulado, de que o Sr. Era coordenador. Tudo isso se plantou nesse memorial de doutrina e prática jurídica de que a leitura é base indispensável à oralidade e às manifestações escritas, postas à prova, sobretudo, na minha primeira audiência, com as devidas alegações orais de pronto.
Sinto-me envaidecido com a leitura do mestre. Isto é um estímulo que me credencia. Mas não sou escritor; escrevo. Não sou poeta; meto-me a fazer versos. Meu pai é um apaixonado, o Sr. o conhece antes de mim. E eu devo a ambos muito do que sou. Um me gerou e me criou; outro clareou-me os sonhos, inspirou-me saudáveis ambições. Mas o discípulo é sempre tímido diante do mestre, tanto quanto grato. Não quero terminar esta carta sem referir-me ao seu filho Douglas Lemes, meu amigo querido. Encontramo-nos no aeroporto de Lisboa, quando lá estive ano passado. Ele ia à Espanha, mas não pude acompanhá-lo. Aqui no Brasil haveremos de nos reencontrar, na minha casa que lhes dispomos.
Quis publicamente retribuir-lhe o elegante gesto. Acho que a carta ainda é o mais louvável e significativo registro desses laços de afeto. Assim o fez Victor Hugo após 100 anos da morte de Voltaire. Assim faço eu na plenitude admirável da vida do inesquecível mestre. Respeitosamente,
Hermílio
______________
Dr. Dagoberto Santiago Lemes é advogado, doutor em Direito Penal, professor, de quem tive a honra de ser aluno. Amigo do meu pai e da minha família. Esta carta é uma singela retribuição ao comentário que ele fez ao meu soneto Janela de Lembrança.
Caríssimo dr. Lemes,
Mui gentis e generosas palavras de um mestre a um ex discípulo. Honrado, agradeço-lhe pela especial deferência com que me apraz sua atenção. Fui eu que me vesti do seu 'lábaro', aqui num ousado trocadilho ao parodiar Castro Alves, a quem aludo por sabê-lo um dos seus favoritos. Para mim, e, sem o sacrilégio de a ele comparar-me, lembro-me só do que escreveu José de Alencar a Machado de Assis, apresentando a este o jovem poeta baiano, em carta que se tornou histórica.
É de literatura que falamos. Mas esta o tem em longo e iluminado caminho percorrido pela ciência jurídica e suas letras. E sabemos que nenhuma ciência está tão intimamente ligada à literatura como a jurídica. Há uma paixão a envolver e unir quem lida com uma à outra. Aqui, o discípulo traz ao vão da memória o que os “suspiros poéticos”, com os quais ilustrava os autos de penal II. Ali referia-se, entre outros doutrinadores, a um Tobias Barreto, um Clovis Beviláqua e, claro, às Espumas Flutuantes do genial poeta. Isto sem que de mim se apague os lampejos de Goethe, a quem me ensinou a ler. Já antes, eu me ligava aos seus filhos no Colégio Marista, assim como o Sr e meu pai, lá pelos “dourados” anos 60.
Quando visitei Olinda, senti a emoção de estar na mesma escola pela qual passaram esses gênios. Lembrei-me do mestre que me encantou e certa vez elogiou-me uma peça. Era um Recurso de Apelação, num júri simulado, de que o Sr. Era coordenador. Tudo isso se plantou nesse memorial de doutrina e prática jurídica de que a leitura é base indispensável à oralidade e às manifestações escritas, postas à prova, sobretudo, na minha primeira audiência, com as devidas alegações orais de pronto.
Sinto-me envaidecido com a leitura do mestre. Isto é um estímulo que me credencia. Mas não sou escritor; escrevo. Não sou poeta; meto-me a fazer versos. Meu pai é um apaixonado, o Sr. o conhece antes de mim. E eu devo a ambos muito do que sou. Um me gerou e me criou; outro clareou-me os sonhos, inspirou-me saudáveis ambições. Mas o discípulo é sempre tímido diante do mestre, tanto quanto grato. Não quero terminar esta carta sem referir-me ao seu filho Douglas Lemes, meu amigo querido. Encontramo-nos no aeroporto de Lisboa, quando lá estive ano passado. Ele ia à Espanha, mas não pude acompanhá-lo. Aqui no Brasil haveremos de nos reencontrar, na minha casa que lhes dispomos.
Quis publicamente retribuir-lhe o elegante gesto. Acho que a carta ainda é o mais louvável e significativo registro desses laços de afeto. Assim o fez Victor Hugo após 100 anos da morte de Voltaire. Assim faço eu na plenitude admirável da vida do inesquecível mestre. Respeitosamente,
Hermílio
______________
Dr. Dagoberto Santiago Lemes é advogado, doutor em Direito Penal, professor, de quem tive a honra de ser aluno. Amigo do meu pai e da minha família. Esta carta é uma singela retribuição ao comentário que ele fez ao meu soneto Janela de Lembrança.