UMA CARTA
Zuleika dos Reis (na carteira de identidade (?) no título de eleitor (?) na carteirinha da UBE(?)... em outros “documentos” que tais.)
Ah, eu te entendo, como te entendo! Queria entender menos. Eu, no entanto, tento, desesperadamente, o mínimo do movimento inverso: ao invés de me dispersar totalmente em outro(s), como tu, tento ainda uma Z. mínima, um centro mínimo a partir do qual a(s) outra(s) "saiam pelo mundo".
Tenho um amigo que, todos os dias, mandava-me e-mails, com dois pseudônimos que se revezavam. Certo dia lhe pedi que me escrevesse com seu próprio nome, S., para que eu pudesse, em algum lugar da vida, me sentir real, um pouco que fosse.
Ele respondeu: “Mas, nós somos tantos! Como vai ser?" Eu retorqui: Apesar disso, de sermos tantos, escreva-me com o seu nome, que eu respondo como Z, a Z. mínima que me for possível.
Isso escrevemos há tempos, meu amigo e eu, esses dois cheios de labirintos, esses nós, que pertencemos, efetivamente, à estirpe dos labirínticos. Não é preciso dizer que a correspondência se fez suspensa, por tempo indeterminado, que meu amigo não consegue me escrever com o S. letra inicial do seu nome... próprio.
Se eu pudesse, me seria cigana, assim como tu gostarias de ser o palhaço de um desses circos de periferia; como não o posso, preciso me vestir o possível de uma Z. qualquer, que não pode, esta Z., pretender, com toda a clareza fundamental, a ajuda de uma fé específica (embora reconheça o poder de todas), nem de psicanalistas (não que os menospreze, longe disso), e ainda menos de livros ou de palavras de auto ajuda ??? (também nada tenho contra elas, fique claro).
Cigana, não das que leem mãos e adivinham futuros, mas porque as ciganas perambulam pelas ruas, o que deve ser mais suave do que se poder perambular apenas por dentro de si mesmo.
Por isso tudo te entendo, ah, como te entendo! Quisera entender menos. Só devo te dizer que desses, como nós, há uma legião, todos espalhados pelo mundo, num país chamado APÁTRIA, (não apátrida, que é outra coisa) título de conto que escrevi há muitos, muitos anos.
Abraço fraterno de Z. uma desconhecida
Republicação na manhã de 06 de agosto de 2012.