DEPOIMENTO EM UM DIÁRIO
O psiquiatra lhe propôs que ela fizesse terapia. Ela foi, pensando no caminho: “Como dizer da Loucura e das Alucinações minhas e de outrem, como dizê-las?” Sabia que não tinha provas de que a Loucura e as Alucinações fossem parte da de outrem e da sua própria sanidade mental.
Não deu outra: após algumas sessões o terapeuta – que trabalhava em conjunto com o psiquiatra – colocou o veredito no laudo: “NÃO É CASO TRATÁVEL POR TERAPIA.”
A paciente, mentalmente, concordou: “Sim, sou mesmo um caso intratável, mas, que ninguém se preocupe, já que vivo, há anos, em prisão domiciliar, sem direito a habeas corpus nem a apelações, nem a saídas de Natal. Bem, de todo modo, não represento perigo para a sociedade, tenho sido sempre um terrível perigo para mim. Não se preocupem, continuo viva e continuarei viva que, aqui, tenho mãe pra cuidar.”
"Permitam-me dizer-lhes, doutores, o meu auto veredito: “Sou uma espécie de anjo-da-guarda que não deu certo, um anjo torto e manco diante de uma janela, diante de uma paineira. Tal condição deve ser consequência de crimes terríveis cometidos, crimes dos quais não me lembro, jamais me lembrarei.”
“Acho que vou escrever um livro, aqui. Quando terminá-lo, arrumarei um modo de enviá-lo para fora. Quem sabe ganhe algum concurso literário e alguém tenha interesse em publicá-lo. Pena que todos os personagens precisem ter nomes-fantasia, inclusive eu. Nomes- fantasia, como o meu nome, como a minha vida. NOMES-FANTASIA."
“Ainda vou publicar esse livro. Seremos todos personagens inesquecíveis, como alguns personagens de livros dos séculos passados. Personagens de uma sempre quase-tragédia, de uma tragédia desde sempre anunciada, de uma tragédia que nunca se deu o direito de realmente acontecer. Preferiu permanecer sempre como uma Neblina envolvendo tudo, envolvendo tudo e todos nós."
Nota. O autor deste texto não tem preconceitos contra psiquiatras nem contra terapeutas. Escreveu esta carta em um momento de Delírio.
Na manhã de 30 de julho de 2012.