quando eu dizia que amar era paradoxo
Eu não acredito que vou dizer isso: mas era mentira. Mentira quando eu disse que não amava ninguém, que eu detestava clichês, que filmes franceses são a mesma coisa e isso me enjoa. Era mentira. Ou eu devo gostar da sensação de enjôo, do mundo rodando e rodando. Não saber onde estou nem pra onde vou. Era mentira, era mentira. Porque se eu disse era porque tinha alguma importância. Mesmo que mínima, mesmo que do tamanho de um grão de sal que escapa do mar. E essas coisas que me passam rápido, que me fazem fingir que eu estou num carrossel doido onde o que gira é a minha respiração e o meu mundo oscila de vez em quando. Você não está cansado disso? Do de-vez-em-quando. De vez em quando eu odeio e nas outras vezes eu me apaixono. De vez em quando eu morro, mas por outro lado eu volto. De vez em quando perder é achar e depois pula pra achar é perder. E os opostos se juntam como um imã maldito que alguém programou pra nunca errar. Era mentira quando eu disse que detestava o Sol porque eu sempre quis ser ele. Também quando eu insisti que eu não tenho cor favorita porque a minha cor favorita é a expressão dos seus lábios. Eu nem sei se isso pode ser cor. De qualquer forma, era mentira. E me dói, me suga, me contamina isso de virar o rosto sempre quando apareceu na TV alguma cena feliz. Porque eu não acredito na felicidade, eu só sinto. E lembrar o tempo todo que a felicidade não é crença, não é uma religião estúpida que algumas pessoas se cansam de acreditar. Eu só sinto e não enxergo mais nada. Era mentira, eu detesto admitir isso. Viver entorpecida, ter emoções até o gargalo, ser vulcão prestes a se derramar é terrível porque o seu paradoxo é a minha realidade e vice-versa. Amar pra mim é paradoxo e pra você é real. É como ser atropelado por si mesmo. Eu dirijo a minha vida pra colidir com ela mesma. Levo o baque dos dois lados, de todas as formas. E só sinto essa dor que é paraíso em terra de ninguém. Voar sem tirar os pés do chão, que estúpido. Mas é o que tento fazer.