Apenas uma carta

Noite, aquela em que o teu corpo se despe na penumbra. Exaltam-se os perfumes de incenso ardente, na atmosfera fechada deste hemisfério. Acordam-se os sentidos, arrepia-se a pele ao ritmo da música suave que toca sem cessar.

Noite, aquela em que te toco, em que meus dedos desenham o teu corpo nu. A língua precorre as concavidades, absorvendo o sal da vida. A respiração, compassada, acaricia-te, numa onda quente que te trás à memória o mar dos sentimentos Esta, noite, em que te dou, te ofereço, o meu corpo despido, acordado dentro de um sonho, recebo os fluidos do teu corpo como uma benção divina do prazer que tenho em te amar. A boca, devora-te com a suavidade dos lábios que te percorrem o pescoço. Os dedos, desenham sobre a pele circulos de prazer.

Escuto, a tua respiração ofegante sobre o meu ouvido, os corpos, em espasmos frenéticos, crescem, soltando-se das amarras da gravidade. Evapora-se o perfume da pele, deixando as almas dançar sobre nós, na envolvencia desta atmosfera de luxúria e amor.

Noite, esta, em que te amo o corpo, em que te afágo a alma.

Esperas-me, com as tuas asas de anjo, adormecida sobre aquela nuvem suave. Sentes na face a brisa do meu respirar, em compassadas exalações, que te abraçam o corpo. Voo por entre as brumas da Noite, ao teu encontro, pelo caminho deixo o perfume do jasmim, e a luz de um sol à muito apagado.

O frio, contorna-me as asas, e gela-me o corpo desnudo das penas que perdi nesta caminhada, não sou Homem, não sou ave, sou apenas sentidos, intenções e emoções, um fluxo etéreo que vagueia pelo nada, à procura de abraçar o teu corpo.

Da noite, conservo o escuro dos tempos, a luz das estrelas, e o silêncio, que carrego comigo para todos os cantos do Universo. Espero encontrar-te, no lugar marcado na eternidade dos tempos, aquele lugar secreto, essa nuvem macia onde o teu corpo se esconde.

Hoje, escuto-te o canto, como uma sereia, que me chama, luz do meu caminho, voz doce que me embala, me abraça e me dá vida. Escuto-te, no silêncio desta noite apagada, sigo-te, como se perseguisse a vida, tentando alcançar-te.

Estiro os dedos e sinto, o calor do teu corpo, transforma o vazio num corpo, o meu, e ali, sobre aquele pedaço de paraíso, assistimos ao despertar da eternidade.

Helena Correia
Enviado por Helena Correia em 01/07/2012
Código do texto: T3754156