CARTA DE CIENTISTAS À PRESIDENTE DILMA (RIO + 20 )

Mudanças climáticas: hora de se recobrar o bom senso

São Paulo, 14 de maio de 2012

Exma. Sra.

Dilma Vana Rousseff

Presidenta da República Federativa do Brasil

Excelentíssima Senhora Presidenta:

Em uma recente reunião do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, a

senhora afirmou, oportunamente, que a fantasia não tem lugar nas

discussões sobre um novo paradigma de crescimento – do qual a

Humanidade necessita, de fato, para proporcionar a extensão dos

benefícios do conhecimento a todas as sociedades do planeta. Com igual

propriedade, a senhora assinalou, também, que o debate sobre o

desenvolvimento sustentado precisa ser pautado pelo direito dos povos

ao progresso, com o devido fundamento científico.

Assim sendo, permita-nos complementar tais formulações, observando que

as discussões sobre o tema central da agenda ambiental, as mudanças

climáticas, têm sido pautadas, predominantemente, por motivações

ideológicas, políticas, econômicas e acadêmicas restritas. Isto as têm

afastado, não apenas dos princípios basilares da prática científica,

como também dos interesses maiores das sociedades de todo o mundo,

inclusive a brasileira. Por isso, apresentamos-lhe as considerações a

seguir.

1) Não há evidências físicas da influência humana no clima global:

A despeito de todo o sensacionalismo a respeito, não existe qualquer

evidência física observada no mundo real, que permita demonstrar que

as mudanças climáticas globais, ocorridas desde a Revolução Industrial

do século XVIII, sejam anômalas em relação às ocorridas anteriormente,

no passado histórico e geológico – anomalias que, se ocorressem,

caracterizariam a influência humana.

Todos os prognósticos que indicam elevações exageradas das

temperaturas e dos níveis do mar, nas décadas vindouras, além de

outros efeitos negativos atribuídos ao lançamento de compostos de

carbono de origem humana (antropogênicos) na atmosfera, baseiam-se em

projeções de modelos matemáticos, que constituem apenas simplificações

limitadas do sistema climático – e, portanto, não deveriam ser usados

para fundamentar políticas públicas e estratégias de longo alcance e

com grandes impactos socioeconômicos de âmbito global.

A influência humana no clima restringe-se às cidades e seus entornos,

em situações específicas de calmarias, sendo esses efeitos bastante

conhecidos, mas sem influência em escala planetária. Para que a ação

humana no clima global ficasse demonstrada, seria preciso que, nos

últimos dois séculos, estivessem ocorrendo níveis inusitadamente altos

de temperaturas e níveis do mar e, principalmente, que as suas taxas

de variação (gradientes) fossem superiores às verificadas

anteriormente.

O relatório de 2007 do Painel Intergovernamental de Mudanças

Climáticas (IPCC) registra que, no período 1850-2000, a temperatura

média global aumentou 0,74oC, e que, entre 1870 e 2000, os níveis do

mar subiram 0,2 m.

Ora, ao longo do Holoceno, a época geológica correspondente aos

últimos 12.000 anos em que a Civilização tem existido, houve diversos

períodos com temperaturas mais altas que as atuais. No Holoceno Médio,

há 6.000-8.000 anos, as temperaturas médias chegaram a ser 2oC a 3oC

superiores às atuais, enquanto os níveis do mar atingiram até 3 metros

acima do atual. Igualmente, nos períodos quentes conhecidos como

Minoano (1500-1200 a.C.), Romano (séc. VI a.C.-V d.C.) e Medieval

(séc. X-XIII d.C.), as temperaturas foram mais de 1oC superiores às

atuais.

Quanto às taxas de variação desses indicadores, não se observa

qualquer aceleração anormal delas nos últimos dois séculos. Ao

contrário, nos últimos 20.000 anos, desde o início do degelo da última

glaciação, houve períodos em que os gradientes das temperaturas e dos

níveis do mar chegaram a ser uma ordem de grandeza superiores aos

verificados desde o século XIX.

Entre 12.900 e 11.600 anos atrás, no período frio denominado Dryas

Recente, as temperaturas caíram cerca de 8oC em menos de 50 anos e, ao

término dele, voltaram a subir na mesma proporção, em pouco mais de

meio século.

Quanto ao nível do mar, ele subiu cerca de 120 metros, entre 18.000 e

6.000 anos atrás, o que equivale a uma taxa média de 1 metro por

século, suficientemente rápida para impactar visualmente as gerações

sucessivas das populações que habitavam as margens continentais. No

período entre 14.650 e 14.300 anos atrás, a elevação foi ainda mais

acelerada, atingindo cerca de 14 metros em apenas 350 anos – média de

4 metros por século.

Tais dados representam apenas uma ínfima fração das evidências

proporcionadas por, literalmente, milhares de estudos realizados em

todos os continentes, por cientistas de dezenas de países, devidamente

publicados na literatura científica internacional. Desafortunadamente,

é raro que algum destes estudos ganhe repercussão na mídia, quase

sempre mais inclinada à promoção de um alarmismo sensacionalista e

desorientador.

Por conseguinte, as variações observadas no período da

industrialização se enquadram, com muita folga, dentro da faixa de

oscilações naturais do clima e, portanto, não podem ser atribuídas ao

uso dos combustíveis fósseis ou a qualquer outro tipo de atividade

vinculada ao desenvolvimento humano.

2) A hipótese “antropogênica” é um desserviço à ciência:

A boa prática científica pressupõe a busca permanente de uma

convergência entre hipóteses e evidências. Como a hipótese do

aquecimento global antropogênico (AGA) não se fundamenta em evidências

físicas observadas, a insistência na sua preservação representa um

grande desserviço à Ciência e à sua necessária colocação a serviço do

progresso da Humanidade.

A História registra numerosos exemplos dos efeitos nefastos do

atrelamento da Ciência a ideologias e outros interesses restritos. Nos

países da antiga URSS, as Ciências Agrícolas e Biológicas ainda se

ressentem das consequências do atraso de décadas provocado pela sua

subordinação aos ditames e à truculência de Trofim D. Lysenko, apoiado

pelo ditador Josef Stálin e seus sucessores imediatos, que rejeitava a

Genética, mesmo diante dos avanços obtidos por cientistas de todo o

mundo, inclusive na própria URSS, por considerá-la uma “ciência

burguesa e antirrevolucionária”. O empenho na imposição do AGA, sem as

devidas evidências, equivale a uma versão atual do “lysenkoísmo”, que

tem custado caro à Humanidade, em recursos humanos, técnicos e

econômicos desperdiçados com um problema inexistente.

Ademais, ao conferir ao dióxido de carbono (CO2) e outros gases

produzidos pelas atividades humanas o papel de principais

protagonistas da dinâmica climática, a hipótese do AGA simplifica e

distorce um processo extremamente complexo, no qual interagem fatores

astrofísicos, atmosféricos, oceânicos, geológicos, geomorfológicos e

biológicos, que a Ciência apenas começa a entender em sua abrangência.

Um exemplo dos riscos dessa simplificação é a possibilidade real de

que o período até a década de 2030 experimente um considerável

resfriamento, em vez de aquecimento, devido ao efeito combinado de um

período de baixa atividade solar e de uma fase de resfriamento do

oceano Pacífico (Oscilação Decadal do Pacífico-ODP), em um cenário

semelhante ao verificado entre 1947 e 1976. Vale observar que, naquele

intervalo, o Brasil experimentou uma redução de 10-30% nas chuvas, o

que acarretou problemas de abastecimento de água e geração elétrica,

além de um aumento das geadas fortes, que muito contribuíram para

erradicar o café no Paraná. Se tais condições se repetirem, o País

poderá ter sérios problemas, inclusive, nas áreas de expansão da

fronteira agrícola das regiões Centro-Oeste e Norte e na geração

hidrelétrica (particularmente, considerando a proliferação de

reservatórios “a fio d’água”, impostos pelas restrições ambientais).

A propósito, o decantado limite de 2oC para a elevação das

temperaturas, que, supostamente, não poderia ser superado e tem

justificado todas as restrições propostas para os combustíveis

fósseis, em âmbito internacional, também não tem qualquer base

científica: trata-se de uma criação “política” do físico Hans-Joachim

Schellnhuber, assessor científico do governo alemão, como admitido por

ele próprio, em uma entrevista à revista Der Spiegel (17/10/2010).

3) O alarmismo climático é contraproducente:

As mudanças constituem o estado permanente do sistema climático – pelo

que a expressão “mudanças climáticas” chega a ser redundante. Por

isso, o alarmismo que tem caracterizado as discussões sobre o tema é

extremamente prejudicial à atitude correta necessária diante dos

fenômenos climáticos, que deve ser orientada pelo bom senso e pelo

conceito de resiliência, em lugar de submeter as sociedades a

restrições tecnológicas e econômicas absolutamente desnecessárias.

No caso, resiliência significa a flexibilidade das condições físicas

de sobrevivência e funcionamento das sociedades, além da capacidade de

resposta às emergências, permitindo-lhes reduzir a sua vulnerabilidade

às oscilações climáticas e outros fenômenos naturais potencialmente

perigosos. Tais requisitos incluem, por exemplo, a redundância de

fontes alimentícias (inclusive a disponibilidade de sementes

geneticamente modificadas para todas as condições climáticas),

capacidade de armazenamento de alimentos, infraestrutura de

transportes, energia e comunicações e outros fatores.

Portanto, o caminho mais racional e eficiente para aumentar a

resiliência da Humanidade, diante das mudanças climáticas inevitáveis,

é a elevação geral dos seus níveis de desenvolvimento e progresso aos

patamares permitidos pela Ciência e pela Tecnologia modernas.

Além disso, o alarmismo desvia as atenções das emergências e

prioridades reais. Um exemplo é a indisponibilidade de sistemas de

saneamento básico para mais da metade da população mundial, cujas

consequências constituem, de longe, o principal problema ambiental do

planeta. Outro é a falta de acesso à eletricidade, que atinge mais de

1,5 bilhão de pessoas, principalmente na Ásia, África e América

Latina.

No Brasil, sem mencionar o déficit de saneamento, grande parte dos

recursos que têm sido alocados a programas vinculados às mudanças

climáticas, segundo o enfoque da redução das emissões de carbono,

teria uma destinação mais útil à sociedade se fosse empregada na

correção de deficiências reais, como: a falta de um satélite

meteorológico próprio (de que dispõem países como a China e a Índia);

a ampliação e melhor distribuição territorial da rede de estações

meteorológicas, inferior aos padrões recomendados pela Organização

Meteorológica Mundial, para um território com as dimensões do

brasileiro; o aumento do número de radares meteorológicos e a sua

interligação aos sistemas de defesa civil; a consolidação de uma base

nacional de dados climatológicos, agrupando os dados de todas as

estações meteorológicas do País, boa parte dos quais sequer foi

digitalizada; e numerosas outras.

4) A “descarbonização” da economia é desnecessária e economicamente deletéria:

Uma vez que as emissões antropogênicas de carbono não provocam

impactos verificáveis no clima global, toda a agenda da

“descarbonização” da economia, ou “economia de baixo carbono”, se

torna desnecessária e contraproducente – sendo, na verdade, uma

pseudo-solução para um problema inexistente. A insistência na sua

preservação, por força da inércia do status quo, não implicará em

qualquer efeito sobre o clima, mas tenderá a aprofundar os seus

numerosos impactos negativos.

O principal deles é o encarecimento desnecessário das tarifas de

energia e de uma série de atividades econômicas, em razão de: a) os

pesados subsídios concedidos à exploração de fontes energéticas de

baixa eficiência, como a eólica e solar – ademais, inaptas para a

geração elétrica de base (e já em retração na União Europeia, que

investiu fortemente nelas); b) a imposição de cotas e taxas vinculadas

às emissões de carbono, como fizeram a União Europeia, para viabilizar

o seu mercado de créditos de carbono, e a Austrália, sob grande

rejeição popular; c) a imposição de medidas de captura e sequestro de

carbono (CCS) a várias atividades.

Os principais beneficiários de tais medidas têm sido os fornecedores

de equipamentos e serviços de CCS e os participantes dos

intrinsecamente inúteis mercados de carbono, que não têm qualquer

fundamento econômico real e se sustentam tão-somente em uma demanda

artificial criada sobre uma necessidade inexistente. Vale acrescentar

que tais mercados têm se prestado a toda sorte de atividades

fraudulentas, inclusive no Brasil, onde autoridades federais

investigam contratos de carbono ilegais envolvendo tribos indígenas,

na Amazônia, e a criação irregular de áreas de proteção ambiental para

tais finalidades escusas, no estado de São Paulo.

5) É preciso uma guinada para o futuro:

Pela primeira vez na História, a Humanidade detém um acervo de

conhecimentos e recursos físicos, técnicos e humanos, para prover a

virtual totalidade das necessidades materiais de uma população ainda

maior que a atual. Esta perspectiva viabiliza a possibilidade de se

universalizar – de uma forma inteiramente sustentável – os níveis

gerais de bem-estar usufruídos pelos países mais avançados, em termos

de infraestrutura de água, saneamento, energia, transportes,

comunicações, serviços de saúde e educação e outras conquistas da vida

civilizada moderna. A despeito dos falaciosos argumentos contrários a

tal perspectiva, os principais obstáculos à sua concretização, em

menos de duas gerações, são mentais e políticos, e não físicos e

ambientais.

Para tanto, o alarmismo ambientalista, em geral, e climático, em

particular, terá que ser apeado do seu atual pedestal de privilégios

imerecidos e substituído por uma estratégia que privilegie os

princípios científicos, o bem comum e o bom senso.

A conferência Rio+20 poderá ser uma oportuna plataforma para essa

necessária reorientação.

Kenitiro Suguio

Geólogo, Doutor em Geologia

Professor Emérito do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (USP)

Membro titular da Academia Brasileira de Ciências

Luiz Carlos Baldicero Molion

Físico, Doutor em Meteorologia e Pós-doutor em Hidrologia de Florestas

Pesquisador Sênior (aposentado) do Instituto Nacional de Pesquisas

Espaciais (INPE)

Professor Associado da Universidade Federal de Alagoas (UFAL)

Fernando de Mello Gomide

Físico, Professor Titular (aposentado) do Instituto Tecnológico da

Aeronáutica (ITA)

Co-autor do livro Philosophy of Science: Brief History (Amazon Books,

2010, com Marcelo Samuel Berman)

José Bueno Conti

Geógrafo, Doutor em Geografia Física e Livre-docente em Climatologia

Professor Titular do Departamento de Geografia da Universidade de São

Paulo (USP)

Autor do livro Clima e meio ambiente (Atual, 2011)

José Carlos Parente de Oliveira

Físico, Doutor em Física e Pós-doutor em Física da Atmosfera

Professor Associado (aposentado) da Universidade Federal do Ceará (UFC)

Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE)

Francisco Arthur Silva Vecchia

Engenheiro de Produção, Mestre em Arquitetura e Doutor em Geografia

Professor Associado do Departamento de Hidráulica e Saneamento da

Escola de Engenharia de São Carlos–USP

Diretor do Centro de Recursos Hídricos e Ecologia Aplicada (CRHEA)

Ricardo Augusto Felicio

Meteorologista, Mestre e Doutor em Climatologia

Professor do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP)

Antonio Jaschke Machado

Meteorologista, Mestre e Doutor em Climatologia

Professor do Departamento de Geografia da Universidade Estadual

Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP)

João Wagner Alencar Castro

Geólogo, Mestre em Sedimentologia e Doutor em Geomorfologia

Professor Adjunto do Departamento de Geologia da Universidade Federal

do Rio de Janeiro (UFRJ)

Chefe do Departamento de Geologia e Paleontologia do Museu Nacional/UFRJ

Helena Polivanov

Geóloga, Mestra em Geologia de Engenharia e Doutora em Geologia de

Engenharia e Ambiental

Professora Associada do Departamento de Geologia da Universidade

Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

Gustavo Macedo de Mello Baptista

Geógrafo, Mestre em Tecnologia Ambiental e Recursos Hídricos e Doutor

em Geologia

Professor Adjunto do Instituto de Geociências da Universidade de Brasília (UnB)

Autor do livro Aquecimento Global: ciência ou religião? (Hinterlândia, 2009)

Paulo Cesar Soares

Geólogo, Doutor em Ciências Geológicas e Livre-docente em Estratigrafia

Professor Titular da Universidade Federal do Paraná (UFPR)

Gildo Magalhães dos Santos Filho

Engenheiro eletrônico, Doutor em História Social e Livre-docente em

História da Ciência e Tecnologia

Professor Associado do Departamento de História da Universidade de São

Paulo (USP)

Paulo Cesar Martins Pereira de Azevedo Branco

Geólogo, Pesquisador em Geociências (B-sênior) do Serviço Geológico do

Brasil – CPRM

Daniela de Souza Onça

Geógrafa, Mestra e Doutora em Climatologia

Professora da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)

Marcos José de Oliveira

Engenheiro Ambiental, Mestre em Engenharia Ambiental e Climatologia Aplicada

Doutorando em Geociências Aplicadas na Universidade de Brasília (UnB)

Geraldo Luís Saraiva Lino

Geólogo, coeditor do sítio Alerta em Rede

Autor do livro A fraude do aquecimento global: como um fenômeno

natural foi convertido numa falsa emergência mundial (Capax Dei, 2009)

Maria Angélica Barreto Ramos

Geóloga, Pesquisadora em Geociências (Sênior) do Serviço Geológico do

Brasil – CPRM

Eliane Thompson
Enviado por Eliane Thompson em 20/06/2012
Código do texto: T3733996
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