Morte fria.

Quero deixar claro, primeiramente, que não sou o tipo de pessoa que anda em frente olhando os pedaços deixados para trás. Eu sempre preferi o presente. Adorava planejar o futuro.

O problema, porém, foi quando decidi incluir-lhe nele. Ou pior, talvez, quando você pareceu não estar de acordo com meus planos mais inocentes e infantis. Você estava em crise, eu sempre soube. Eu prometia lhe ajudar, você sabia, também. Eu briguei para que você sentisse alguma coisa. Raiva, ódio, compaixão. Amor, talvez. Você, porém, resistiu a todas as minhas falhas tentativas de recolocar-lhe em pé, por mais que seus pedaços ainda estivessem estraçalhados ao chão. Você insistiu em deixar-me de lado para viver em seu mundo individualista, no qual seus dias eram repletos de sua insegurança em perder tudo. Tudo, menos eu. E, enquanto você calculava todos os seus passos, todas as suas jogadas, eu ia me perdendo dentro de uma pele que não mais era minha, um corpo que deixou de amar-me. Era você quem deveria me perder, mas era você quem tinha-me diante das maiores demonstrações de indiferença e rancor que alguém poderia oferecer. Você ganhava-me. Sem justificativas plausíveis, sem motivos aparentes. Eu gostava, simplesmente, de ser sua. E, sua, fui, durante esses dois anos que, pelo que vejo, não passaram de um simples teste seu.

Talvez, todo esse tempo, eu tenha sido inexplicavelmente invisível para você. Ao mesmo tempo, no entanto, eu era um apoio. A cadeira na qual você se sentava quando se cansava, porque não há corpo algum que se sustente sozinho por meses e anos. E você se levantava sem olhar para trás, porque eu deixava. Julgava-o livre para voar, enquanto você se julgou livre o suficiente para ir e não voltar, por mais que minhas mãos o chamassem, meus lábios implorassem pela sua presença ao meu lado. Você não se importava, mas eu continuava movendo meus pedaços em busca de um coração que eu sabia ser inexistente.

E, observando-nos, ao longe — bem longe, posso sentir meus pés tremendo, minhas mãos congelando, meu corpo perdendo sua temperatura, enquanto minha vida se esvai em segundos de dor, de cólera, de gritos. Talvez, um dia, eu te perdoe. Por ter sido tão frio, tão calculista, tão sádico, tão… Você.

Raíssa César
Enviado por Raíssa César em 15/06/2012
Código do texto: T3725648
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