Desgraça Favorita
Tudo começou com aquela sessão de skate num domingo de sol. Eu, minha amiga de sempre, você e seu amigo de sempre. Já nos conhecíamos, tínhamos até alguns amigos em comum e tudo mais, mas jamais havia passado pelas nossas mentes a mínima possibilidade de nos aproximarmos, e nem a mínima vontade de fazê-lo. Você tinha preguiça de gente e eu, também não fazia a mínima questão da presença delas, embora sempre estivesse nos encontros desses tais amigos. Acho que era mais por refúgio, naquela época em que ficar em casa, no interior de São Paulo, era mais agonizante que qualquer coisa. E então eu saia. Bebia demais, falava demais, fumava demais, e até – acredite- era bem feliz. Sabia que eu jamais chamaria sua atenção. E nem queria. Definitivamente não sou o tipo de mulher que chama atenção de muitos homens. Não uso maquiagem, não sou nada delicada, tenho uma voz rouca e grave, sou alta e desengonçada, e todas as outras coisas que sua mamãe não quer em uma nora. A delicadeza em pessoa, só que ao contrário.
Mas naquele domingo, sete de janeiro, foi diferente. Eu queria aprender dar ollie e já fui te intimando a me ensinar. Você, mesmo com aquela cara de preguiça/insatisfação/irritação/desgosto de sempre, foi bem prestativo. Falava de tudo o que eu estava errando (e era tudo mesmo), e repetia irritante e copiosamente que eu deveria ficar mais de lado, dobrar os joelhos e bater o tail. “Sim, sim, eu sei, mas não consigo, porra!”, eu pensava, mas ficava quieta por estar precisando de ajuda no skate e raramente encontrar alguém disposto a ensinar sem fazer qualquer tipo de gracinha idiota. Gostei de você ali, naquele momento. Te observei praguejando ao errar um flip, xingando ao acertar a canela com o nose, fazendo cara de “Iiii” quando algum muleque de dez anos acertava alguma manobra fodida, e isso me deixou encantada. Mesmo odiando a vida, você ama o skate. Mesmo não acertando tudo o que quer, você continua. Do caralho. Foda mesmo. E essa foi a primeira das muitas vezes que te admirei por algo.
Depois da sessão veio a primeira mensagem: “sabe cat, reparei que estou levemente afim de você”. Fiquei puta. Como assim “levemente”? Que tipo de filho da puta com síndrome de pica de ouro fala isso? Que babaca. E pra minha infelicidade, não parei de pensar no babaca. E pra minha felicidade, alguns dias depois já nos encontramos. No MASP, e ainda fui eu quem te beijei. Você é bem desajeitado com mulheres no começo. Mas a cada minuto que passava eu gostava mais de você.
E aí, motelzinho, galeria do rock, minha primeira tatuagem(no peito, que decidi fazer do nada, com você me encorajando), cervejas, desfilar de calcinha pra você no motel pela primeira vez, muitas brigas, status de relacionamento do facebook pendente, muitas calcinhas compradas de última hora pra sair do trabalho e dormir na sua casa, cafés na cama, tapas na cara, orgasmos, sessões de skate, finais de semana sem arredar o rabo de casa, Preta, Spyke, Erick, Anubis, seus vizinhos insuportáveis, sua cama deliciosa e aquele cobertorzinho que me faz dormir. Sabe, tantas coisas boas pra lembrar. Construidas em tão pouco tempo. Destruídas(?) em menos tempo ainda. E tantas ruins pra evitar. Somos confusos demais um pro outro. Mal resolvidos demais com nós mesmos pra nos resolvermos entre nós. É é melhor assim.
Mas independente do tipo de fim, você foi, é, e sempre será...
a minha desgraça favorita.