Cara Morte,

Eu acordo, eu ando por aí. Me olho no espelho. Vejo um rosto que já não me pertence. Uma fantasia, uma máscara. O monstro que tenho dentro de mim ruge. Ele quer se libertar. E eu ando tranquilamente, como se nada estivesse acontecendo. Como se algo dentro de mim não gritasse diariamente por liberdade, como se eu não vivesse enfrentando meus piores medos. Eu prendo ele mais fundo, sinto uma dor no peito, uma dor na alma. E sigo. Apenas sigo em frente. Embora não saiba aonde quero chegar. Não há uma estrada certa.

Neste mundo estranho, nesta prisão da alma e cárcere de sofrimentos, se foram todos a quem já tentei amar. Você sempre sorriu para mim como uma velha amiga, sempre esteve lá nos momentos mais difíceis, me pedindo para me unir à você. Não sei como é o Mundo dos Mortos, mas não pode ser pior que o dos Humanos. Mas eu não quis me unir a você.

Primeiro por almejar vingança, almejar sangue, ódio, um sentimento que nem a mim pertence, que foi implantado em mim por esta alma que quer meu corpo, foi alimentado por ela, vagarosamente consumindo tudo o que me sobrara de humano.

Agora nem consigo entender direito porque não me entrego a você. Seus braços frios me chamam tão incessantemente que o eco de sua voz está a me ensurdecer aos poucos, abafando qualquer outro som.

Eles têm me dito que eu não posso morrer, que sou a última esperança da humanidade. Têm me dito que a raiva é boa. Que eu preciso desse ódio, que é o maior elo que tenho com esta criatura e que ela precisa renascer para que ganhemos a Guerra.

Mas não é por isso que eu luto. Se fosse pelo mundo que tanto me rejeitou e me fez sofrer, já o teria abandonado. Minha única razão de me manter respirando é minha amada Kefi. Se algum dia ela for retirada de mim como foram todos os outros. Deste dia em diante, não haverá mais aurora para mim.

Sei que me espera, cara amiga. Toda vez que olho para o relógio vejo que meu tempo está chegando. E sei que você é impaciente. Mas eu tenho que resistir.

Pelo mundo,

Por Kefi,

Pelo amor,

Pela esperança

Adeus velha amiga, até quando nos encontrarmos de novo.

Marcus Lanetli

Gabriel Valeriolete
Enviado por Gabriel Valeriolete em 05/05/2012
Reeditado em 05/05/2012
Código do texto: T3651855
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