Carta ao meu velho pai (III)
Ôi pai!
Hoje é sexta-feira. Neste momento encontro-me sentada na recepção de uma empresa, aguardando o horário agendado para uma reunião e, ao mesmo tempo, analisando os colaboradores atenderem seus clientes. Estão compenetrados, buscando identificar a necessidade de cada um, ávidos pela resolução de seus problemas. É uma empresa de telecom pai - palavra que o senhor não deve ter ouvido. T-e-l-e-c-o-m-u-n-i-c-a-ç-õ-e-s!
Através da tecnologia, o mundo passou a se comunicar em uma velocidade assustadora. Tudo acontece rápido demais nessa área e, se não acompanharmos as mudanças, certamente ficaremos à margem da sociedade. Mas tem faltado tanta coisa pai ...
Falta o olho no olho,
O toque sutil de apoio no ombro,
A mão que se extende nas dificuldades,
As palavras "faladas",
O abraço,
A cumplicidade.
Eu, particularmente, participo de várias redes sociais com objetivos distintos (profissionais, pessoais como encontro com amigos distantes, postagens importantes que necessitam ser divulgadas, etc.), mas elas me cansam.
Ao mesmo tempo em que a tecnologia avançou, a sensação que eu tenho é a de que a maioria das pessoas se esvaziou. É como se os seus valores estejam em uma caixa na estante muito distante da minha. De que adianta tanta comunicação se não mais sabemos nos comunicar?
Pai, eu quero um aceno,
Um sinal de fumaça,
Uma brasa queimando.
Não quero me tornar refém de tudo isto.
Sabe? tenho um amigo que amo (amor de verdade). Com ele sim esses avanços funcionam. Se não existissem, não teríamos condições de interagir, de auxiliar um ao outro, de sonhar um com o outro. Viva a tecnologia e as telecomunicações neste sentido, neste restrito sentido.
Mas passar email ou SMS para a vizinha é fogo não?
Neste momento volto a olhar para o grande salão e percebo que todos os colaboradores estão em atendimento, com celulares nas mãos programando-os para seus clientes ou atendendo-os por telefone, com seus head-phones grudados nos seus ouvidos. Viví nesse mundo por longos anos e bem sei como é. Nele somos meio robôs, pobres robôs, assim como me sinto agora, pronta para adentrar à reunião e ouvir o que eu já sei: "precisamos de uma proposta de consultoria para ...", "A nossa meta é a de ...", "a visão da empresa é ..." E a base? o capital humano? a base que realmente "faz acontecer"? É percebida?
A sorte é que não retornarei prá casa. Pegarei a auto-estrada, pararei no meio do caminho para um lanche e, no meio dele, certamente pensarei na negação do que acontecerá: um trabalho que levará pesquisa, concentração, muitas horas de esforço, relatórios, análises, diagnósticos e o resultado de sempre: o mundo mudou, as empresas mudaram, a velocidade fez com que elas se debruçassem sob indicadores e, infelizmente, as "pessoas" já não mais assimilam o que lhes é transmitido, porque não acreditam no caminho que trilharão nos próximos anos. O que mais mudará?
Por aí as coisas estão tão velozes assim?
Beijos com a saudade de sempre!
04/05/2012
rosalva-cantinhodopapo.blogspot.com