Querido Pai
Querido Pai,
Parece que foi ontem, que apertava a minha mão
Sim Pai, era você quem segurava as nossas mãos
Disputávamos quem seria o próximo a entrelaçá-la
Éramos nós os moribundos que rodeávamos o teu leito
Ansiando por tocá-lo no esplendor da tua partida
Exaustos buscávamos um lugar diante do calor dos seus olhos
Que como duas lentes mágicas iluminava as nossas lágrimas
Num brilho morno que afagava a nossa dor.
Sua voz era uma melodia divina que acalentava nosso pranto
Era mais que um canto...um encanto,
Ouvimos e fomos ouvidos e se deixamos de dizer algo
É porque foi explicitamente entendido no silencio das nossas vozes
Velamos o seu sono e guardamos os seus sonhos
Acariciamos seu rosto e afagamos seus cabelos
Mesmo dormindo sob os efeitos da morfina
Sua presença era uma dádiva,
Pai , marido, avô, irmão, tio, amigo, sonhador, lenhador corajoso;
Contador de histórias;
Para os meninos era só mais um menino
Entre homens um exemplo de honestidade de conduta de luta
O mais querido entre os amigos
Na festa, o mais esperado
Na igreja o orador
Entre as estrelas a mais brilhante.
Querido pai os seus objetos pessoais ainda guardam seu cheiro
Podemos até ouvir a sua respiração,
Vez ou outra sua risada ecoa num cantinho dos nossos ouvidos
A vontade de te ver mais uma vez aperta
As lágrimas rolam e o coração incha dentro do peito
A saudade fica impregnada arranhando como espinhos
Mas a dor é contida com as lembranças e a certeza que você estará
Sempre vivo em cada um de nós
O tempo passa e a vida segue seu rumo
Como um rio que desce a montanha em direção ao mar
Pai, nossos filhos e os filhos dos nossos filhos ouvirão falar de você como um nobre e lindo cavalheiro que distribuía pão para os que tinham fome, que dava esperança para os que tinham dúvida, orava para os enfermos, e que sabia ouvir mas que falava só o necessário que amou e foi amado, que viveu e foi feliz,
que partiu e deixou todo o seu ouro em forma de luz
sobre o caminho que um dia nos levará até você.