Escorregar pra uma caixa funda
Eu queria saber de onde o barulho vem, de onde tudo se tira o que já acabou. Eu queria saber se, quando as nuvens se chocam, riem ou se sentem dor. Se alguém mais sente dor.
Camila, queria poder te explicar porque sempre sento na cadeira do escritório e organizo minha vida em mil e mil etapas, em mil e mil condições de se dizer não. Porque sempre arrisco resposta onde não há pergunta, arrisco misturar a melodia calma com a vibrante. Porque sempre me misturo. Sempre espero um futuro que nunca vai acontecer, sempre planejo andar por ruas que ainda não foram asfaltadas. Eu queria saber o porquê da madeira apodrecer, de se encher de cupins. O porquê do piso estalar quando passo, o porquê do relógio se rolar no sentido horário. Camila… quase-que-sempre tento me segurar em planos tortos, furados que vão me fazer escorregar para uma caixa funda de papelão desgastado - como uma boneca de pano que a sua avó brincava. E se eu parar de caminhar, se as pernas pedirem pausa da dança, se eu criar raízes no chão… O que mais poderia me separar de mim se nunca vou mudar? É, sei que as gorjetas nunca foram o suficiente; mas não tenho mais o que oferecer. Eu, simplesmente, me esgoto de tanto que me enfiei numa agenda apertadinha, num terno menor que eu. Camila, as coisas vêm me sufocado sem ao menos existirem e eu queria poder saber o porquê da costura se desmanchar. Eu me desmancho, esvaio, caio. Acabo. Como um pavio curto de uma vela aromatizante que não solta cheiro, findo. Sem rastros. Sem emoções. Sem mesmo findar.