Nos perdemos no caminho - Ao meu Pai!

E por tantas vezes eu tentei escrever-te uma carta de amor, mas é injusto fazer isso comigo mesmo, é torturar-me por querer.

Pois quando penso em ti, quando lembro a minha “triste” infância sem você me afogo em um desgosto profundo, um sentimento perverso, e é com cartas assim que tento livrar-me dessas sombras negras que habitam em mim.

Lembra meus oito anos? Pois é, eu lembro bem pouco, mas lembro da mãe, da minha avó, dos tios, dos primos e primas, lembro bem pouquinho mesmo sabe?

Mas não me lembro de você, em nada. Nem nos “nove, dez” é como se você não tivesse existido nessa época, e nas que antecederam essas eu nem falo, não me lembro de nada imagine de você.

Hoje, com vinte e poucos anos, vendo a vida que você leva, sabe eu não tenho pena de ti, tenho vergonha.

Vergonha porque tenho amigos que se orgulham tanto do pai, sabe? Uns que os tem como heróis, e o que eu tenho? Você? Meu herói?

E quantos “dias dos pais” eu passei com a mãe e em quantas comemorações ela foi pra me ver cantar e tocar pra você.

Sabe, eu tento não sentir o que sinto; Essa vergonha de te apresentar como “meu pai”, infelizmente eu não sinto orgulho nenhum nisso, e sim, a culpa é sua.

Porque todas as vezes que eu precisei de você, você nunca pode estar lá? E sempre que eu pensava em te pedir algo você vinha com o “espere clarear”? Porque você nunca veio conversar comigo sobre qualquer coisa idiota?

Eu não tenho culpa da sua criação, e não, eu não sou e nem pretendo ficar igual a você quando for mais velho.

Entenda que amor não se pede não se compra e nem se barganha;

Quando eu era menino não entendia a sua distância para comigo, e agora, já homem, continuo sem entender, mas agora nem se quer quero.

Fico pensando onde foi que nos perdemos, em qual perímetro deixamos de ser ligados por essa “força” que uni os familiares.

Sabe, li uma vez um verso que dizia “Pais e filhos foram feitos para serem pais e filhos e não amigos”; daí parei pra tentar buscar, lá no fundo das minhas turvas memórias uma vez, uma única vez que você tivesse sido um dos dois... e não você não foi, na verdade, não querendo ser injusto acho que você nem tentou.

Hoje comecei a escrever está carta pra você, depois de ruminar todas as lembranças ruins que carrego dentro de mim, de relembrar seu sorriso amarelo e suas mentiras desbotadas, suas desculpas e tudo mais que vem de você, tudo mais que me enoja.

Eu sei que não iremos mudar nada disso, não dá mais, você não consegue e nem sabe se quer... Mas você me ensinou a fazer tudo, completamente diferente de você e isso é ótimo, talvez sem isso eu fosse um estranho com minha família no futuro.

Sei lá, eu nem queria muita coisa de você, na verdade acho que é o sonho de qualquer menino –ou qualquer pessoa- ter uma família, unida, completa.

Mas Deus sabe o que faz e graças a Ele tenho tantos amigos e pais espirituais; Acho que o dom da amizade e da boa conversa herdei de você, pena que isso não sirva pra remendar o rasgo que a sua falta causou ao meu coração, e não, eu não te odeio, na verdade você passou a ser indiferente na minha vida.

Sempre me virei sem você, então porque sentiria falta hoje? Agora que eu sei andar de bicicleta, namorar, amarrar o cadarço, manusear uma arma.

Agora é tarde pra nós dois, porque não existe mais espaço pra você na minha vida, e no meu coração o espaço que você havia deixado abandonado com suas viagens mirabolantes foi habitado por pessoas que sempre estavam ali quando eu precisava.

Lembrei-me uma época que queria apenas estar com você, sabe, estar por estar? Mas nunca foi possível e essa vontade passou, como tantas outras que eu tive... E assim fui não precisando mais de você, pra nada, e fui me afastando cada vez mais e mais de você e hoje é isso que sobrou; Nada!

Isso é tudo pai, siga sempre em paz e que Deus lhe guarde.

Do seu filho, Lucas George

Paschoal George
Enviado por Paschoal George em 02/12/2011
Reeditado em 02/12/2011
Código do texto: T3367488
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