Fim.
Eu sei que não deveria, que não é o momento, que nem é o melhor. Mas eu preciso. Preciso falar disso como quem respira: para não morrer. Ele se foi. Partiu. E nem mesmo está longe. Eu ainda sei onde encontrá-lo. Sei o que provavelmente deve estar fazendo agora, depois do almoço quente. Sei em que lençóis deve estar deitado, e ao lado de quem. Só o que não sei é o que vai lá dentro, no coração que ele prometeu ser só meu. Só não sei o que foi mais importante que eu. Ou melhor, até sei. Cinco filhos, uma família grande, dinheiro. Essas coisas. Isso pesou mais do que o "eu te amo muito, muito mesmo". E hoje, pela manhã, quando surtei, quando o sangue esquentou tanto que eu não via mais nada, era só nisso em que eu conseguia pensar. Enquanto me falavam que ele tinha dito "desculpe, não tenho mais como", tudo em que eu pensava era "Meu Deus, não acredito". Não acreditei. Tinha que ir lá, confirmar. Então fui. Cheguei bem na porta. Mas o tempo da viagem foi calmante, amenizou o furor do abandono. Cheguei lá, e não tive coragem nem de aparecer na janela. Cheguei lá, e não tive a força pra chamá-lo, fazê-lo ao menos vir me ver. Não tive. Voltei para casa com o orgulho destroçado, as marcas roxas no pescoço, sob os olhos e no coração. Os olhos cheios, transbordando. Voltei para casa. Acho que foi isso mesmo. Acabou. Nem nos falamos. Vou embora amanhã, e nem vamos nos falar. Acabou. E não eram essas as músicas que eu queria cantar. Não era desse jeito. Queria dizer "Vem cá, meu bem, que é bom lhe ver O mundo anda tão complicado E hoje eu quero fazer tudo por você". Mas só consigo me lembrar dessas outras. "Quando acreditei que tudo era um fato consumado Veio a foice E jogou-te longe Longe do meu lado". E "Dos nossos planos é que tenho mais saudade Quando olhávamos juntos na mesma direção...". Mas é isso. Acabou. "Já que você não está aqui, o que posso fazer é cuidar de mim." Acabou. Vou embora. "Lembra que o plano era ficarmos bem...". Acabou. Vou embora.
10/12/2010.