Dança da primavera
Querida MM
Quisera ter engenho e arte para escrever a carta que você merece, escrita com alma. Temperada com amor ainda que seja uma carta no computador, pois tenho tido tantas coisas para atrapalhar neste meu intenso trabalhar.
Por aqui é primavera também, embora nos trópicos quase não seja notada. A primavera é o sorriso da natureza. Lembro que você deve estar reparando que mesmo com as queimadas continuando a ferir o coração da terra, a paisagem começa a mudar. Notou que surgem os primeiros frutos dos cajueiros? Que ali, lá e acolá algumas árvores florescem renovando a vida?
Bem que gostaria de estar aí para dançar com você a dança da primavera, chamada Kwasay Sumak , “O Bem Viver” dos índios nossos ancestrais. De frente, eu sei. Você prefere frente a frente no frente do ventre. Você é mais espiritual que eu, com certeza! Sou mais materialista, infelizmente. A vida cheia de ceticismo iluminista me induziu a ser ritualista, arranjando subterfúgios para fazer as coisas atrás, no atrás do trás, depressinha. De frente ou atrás são apenas conceitos, embora possa se concretizar de formas diversas (nem sempre fáceis definir) a dança da primavera.
A minha mente não alcança porque a maioria das pessoas não consegue associar “dança” com espiritualidade. Mesmo sem saber, toda pessoa carrega no mais íntimo do seu ser uma dança que é só sua. Já se nasce com isso no coração. O que acontece é que o ambiente cultural, tradições e religiões, via de regra, reprimem a dança.
Desejo sinceramente que a primavera desperte em nós uma renovação do nosso ser e nos permita viver mais intensamente nesta estrada de vida já traçada, de trás pra frente, seguindo rumo ao destino apontado.
Bom início de chuvas, com beijos (molhados).