Carta à Zezè
Zezé
Minha doce amada.
Diante deste impasse, da continuada irrealização, e do silêncio ensurdecedor que abateu-se sobre nós, não me restou nada mais senão dar esse grito abafado, e escrever esta carta. Sufocado pelo desejo, e flutuando entre a dúvida e a esperança de uma certeza, me inclino agora a julgar-te uma mulher sem alma. Mas, eu sei que isto não pode ser, por te conhecer, como conheço. Entretanto, não consigo compreender o pulsar do teu coração ao tentar decifrar o código secreto do escorpião, difícil e exaustivo. Somente vejo-te descrevendo um arco de luz quase apagado. Somente escuto o soluço dos meus pobres sentimentos encerrados numa angústia, e entre nós a impressão de uma realidade nebulosa por demasiado. Daí, esse apelo, e essa paixão de chamas incontroladas. Antes de julgar-te, sou por opção teu advogado para defender-te sempre, no tribunal de minha consciência, e perante Deus tentar provar tua inocência. Mas, também posso definir como imprevisível tua atitude... A realização de nosso amor, pode ser um sonho, uma exótica fantasia, mas pode ser também uma realidade feito um jogo de xadrez, onde corremos riscos calculados. Na vida também é assim, às vezes ganhamos, às vezes perdemos...Mas, existe sempre uma razão para se viver e para se jogar. A busca da Felicidade, este objeto tão desejado quase sempre não alcançado, surrealista e esmagador que no seu caso há algo suplementar: A ausência de tua liberdade, por que não te considero livre. Nossa forma de felicidade, idealizei-a num modelo que não serve como protótipo para ninguém, supostamente aventureira e leviana mas é o paradigma que o destino nos concedeu. Se ela não for real agora, no presente, se ela está codificada, como decifra-la sem buscar uma saída? Esta existência que chamamos de vida, é efêmera, mas nós dois sabemos que existirão outras nos esperando... Às vezes, Deus perde seu tempo nos dando uma segunda chance e entre encontros e despedidas sorrisos e lágrimas, quantas vezes dissemos adeus? Nenhuma. Sete anos se passaram, e nada realizamos. O que dizer no futuro daqui a sete anos? È bem possível que estaremos nos lamentando, meu amor? Certas horas, quando cai a noite sobre meu espírito, imagino coisas, e analiso nossa situação bem assim: Será uma situação simplesmente cômoda? Mas para quem? Pra mim, pra você ou para seu marido? Quem sabe, o será para todos... Eu, só sei que não posso mais conciliar, pois, se não posso ter o objeto do meu amor, então ele não pertence mais ao meu mundo. Nosso amor de rara beleza, dádiva de Eros, seguramente falta algo essencial tá? Daí,parece que nos enganamos mutuamente mas dentro de uma verdade que não posso negar: De mim, eclode uma certeza que eu te amo mas você faz questão de dizer não acreditar. Aparentemente, você demonstra em momentos próprios seu desejo e afeição,posso dizer amor correspondido? Então,questiono a recíproca: Onde está tua declaração de intenções? Por que não participo de teus planos futuros? Se você, ainda tem dúvidas, Zezé, então pode estar consumado, pode ser o crepúsculo de nosso amor. Declarações, olhares brilhantes e orgasmos são insuficientes para realizar-mos, falta nos algo concreto,convicções, desejos mais fortes. Ainda assim, sinto em muitas situações o quanto você me quer. Mas, suas atitudes, não justificam tuas emoções, pois o fato de eu ser uma pessoa muito especial como você sempre me diz, não explicita aquele algo que se chama amor... Da mesma forma, quando nos entregamos ao prazer, nossos corpos e mentes, agradecem e ansiamos diariamente pela renovação deste pendor. Mas, como ficam nossas almas semelhantes? Sexo, não é tudo, é parte integral deste conceito. Neste banquete de beijos molhados, corpos que se abraçam e orgasmos que parecem não terminarem, falta algo: É como se ficássemos degustando as entradas, sem nos servirmos do prato principal. Então, como posso caminhar nesta estrada paralela da dúvida e da esperança? É bom você começar a escutar a voz do teu coração, ele, sempre tem algo para dizer. Perceba, que amizade e compreensão não bastam com suas virtudes, e querer bem não é o mesmo de gostar e amar. Por outro lado, nada tenho a temer a não ser a mim mesmo, e a perder, a não ser as pessoas a que amo.
Tenha certeza de uma coisa: Não desistirei de você, e arrisco dizer: Uma dia você ainda será minha mulher de verdade. Essa é minha tragédia.
Então, diante desta visão te pergunto: Que diabos terei que fazer para conquistar-te de vez? Ganhar na loteria ? Talvez. Mas, te suplico: não deixes apagar o brilho verde nos teus olhos diante de mim, não abaixes a cabeça- és uma princesa, não me evites, sorria! Nosso contato físico é vital. Nossas emoções não podem morrer assim...
Faça uma revisão nos teus valores psicológicos, morais, sociais e espirituais, depois responda-te: Sou feliz? Ou me sinto feliz? Ser e estar, são coisas diferentes, neste caso. Tudo que brilha e reluz, pode não ser precioso, e você mesma já sabe que o metal que ofusca, é o mesmo que engana. Pode ser falso o brilho deste ouro! Considere que, um dia, no futuro poderemos juntos contemplar-mos o verdadeiro brilho de um metal brilhante que nunca acaba. Também somos muito parecidos e convivemos bem com nossas diferenças. Afinidade, parece ser a palavra certa para definir-mos por que, parecemos irmãos, sorrimos juntos, gostamos e desgostamos das mesmas coisas. Raciocinamos em grande velocidade, por isso não temos problemas para o entendimento, daí, abre-se diante de nós a cortina de um cenário que mais parece uma peça de Shakespeare, porém inacabada, bela e angustiante, uma tragicomédia.
Seria isso um indício, uma suspeita ou um apelo da Fortuna para uma união feliz? Há mais. Conto com minha afeição pelas suas filhas cuja espontaneidade me permito dizer: gosto muito daquelas meninas. Então, porque apagar o brilho do sol dentro de nós? Não permitas fazer-me acreditar que tudo isto não passou de uma caprichosa ilusão, uma fantasia erótica ou um belo sonho-O conteúdo colorido da paixão. Abras teu coração, minha adorada fêmea e deixes fluir não só esta menina graciosa, também a mulher amante e amiga de todas as horas. Mas, não demores tanto por que a distancia de todas as esquinas, e o silêncio de todas as madrugadas que terei insone, onde refletirei sobre as marcas do nosso destino, cuja conclusão forçosamente me levarão a viver uma realidade cruel de uma vida vazia onde sempre haverá uma troca a se fazer: mentira por mentira, sonho por sonho, adeus por adeus! Um dia, agente sempre acorda, o sonho acaba e as recordações boas e ruins farão parte de nós. E, se eu te der um “tempo” como pedistes, o que farás com ele? O tempo no sentido amplo, tem apenas a contagem regressiva, mas eu tentarei compreender-te e te deixarei à vontade para ir e para voltar. Por isso, não aceito a forma como estás agindo comigo, como se vivêssemos na terra do nunca, e nada houvesse entre nós... Lembro-me então aqui, dos versos do poeta francês que diz assim: “ J’ attendrai pás toujours toujours/ que reste-t-il de nos amours/ que rest-t-il de ces beaux jours. “
Vou afastar-me de ti, e terei de sobreviver sem tua graça e, com este amor mal resolvido. Não haverá mais lugar para dúvidas.Não existirá mais metade nem dois caminhos.Ou agente se assume, ou teremos mais sete anos de compasso de espera e de incertezas. Repito: Eu não posso parar de te amar, pelo contrário, tua imagem, teu sorriso e tua irreverência, se expandirão dentro de minha alma.
Enfim, para afastar-me de ti, não careço de tua aprovação, sou livre para decidir, mas você não é... Nós dois sabemos o que queremos e o que fazemos, de minha parte nada tenho para arrepender-me, por que o faço por amor, e você? Você me ama, ou será por carência, aventura ou quem sabe, mais uma vingança do escorpião? Será que não fui usado? Eis aí o mérito desta questão. Uma vez, de tanto eu insistir, declarastes o teu amor a mim... Meu Deus, quando ouvi, dizeres: Eu te amo, meu coração encheu-se de luz, minha alma mergulhou naquele momento no lindo lago do amor... Mas, foi a coisa mais bonita e mais mentirosa que já ouvi de tua boca! Por que brincas assim com meus sentimentos? Sou o teu brinquedo favorito? Menina travessa, até quando vais brincar no meu coração? Eu, deixarei aberto um canal, para ti, como uma antena gigantesca apontada para o céu, a espera de um sinal de vida inteligente...
Entendo, que já não posso te perder, pois não se perde aquilo que não se tem já que tu és propriamente perdida e eu naturalmente perdido. Eu sei que algo existe muito forte entre nos, como sei da grande impossibilidade de realizar-mos nosso amor, como também sei da dificuldade de um doce regresso... Conheço a tua realidade, assim como conheces a minha. Deixo então, a Roda do Destino, desenvolver-se dentro do seu próprio tempo, que não é, nem o seu nem o meu tempo. Este não existe, mas ainda é o melhor dos remédios.
Portanto, minha princesa, preciso que compreendas o valor do meu amor por ti, e, que não posso mais torturar-me com a angústia, a dor, e dispor de um preço tão alto que terei de pagar para satisfazer teus caprichos femininos. Já não basta ter que dividir-te?
Não quero esperar mais!
Por enquanto,
Beijo-te, doce e carinhosamente.
EU.
Álvaro Francisco Frazão.