Ao Ódio, Rancor, Vingança e Tristeza
Como eu queria que chovesse!
Como eu queria ficar chorando na chuva e ver as ruas transbordarem de todo esse ódio, e rancor, e vingança, e tristeza que estou sentindo agora e que ela fosse me lavando gota por gota mas, ainda assim, restaria uma grande parte dentro de mim; e quanto a essa outra parte, confesso, não saberia como fazer sair.
Mesmo que me apunhalassem pelas costas de nada adiantaria: meu sangue está seco e meu coração (que já virou pedra) estilhaçaria toda a lâmina da faca.
Minhas mãos travaram e minha mente ficou vazia por um tempo, parece que todos esses sentimentos não querem sair, pelo menos por enquanto. E quando minha mente voltou a funcionar me vieram tantas lembranças de momentos que eu não tive, me deu vontade de chorar. Mas lembrei que prometi a mim mesmo que seria forte e não choraria. Não agora. Não sem a chuva. Não sem antes entender o que está acontecendo comigo. Não sem antes entender o porquê de todos esses sentimentos guardados e amontoados, farpados e cheios de sangue, que fazem doer e corroer e apodrecer... Não sem antes entender como uma pessoa com tantos sentimentos presos não consegue chorar, nem mesmo para desafogar os sentimentos bons.
O tempo não dá nem sinal de chuva. E acho que até a usaria como desculpa para não ver ninguém... Para não ter que conversar, para não ter que encarar as pessoas, para não deixar as pessoas verem toda essa tristeza que há em mim e que escorre pelos meus olhos no lugar das lágrimas...
Mas depois de um tempo eu percebo que o problema não são as pessoas, são as lembranças! Diz o ditado que "vão os anéis, mas ficam os dedos". Isso serve nos casos em que os anéis não representam nada. Os meus representam muito para mim e sentiria se me fossem tirados a força ou roubados na calada da noite. Mas podem me levar os anéis. Não ligo! Arrumo outros... Acho que já não ligo para mais nada! Nem para os anéis, os sentimentos, a chuva e até mesmo os dedos se quiserem levar!
Estou cansado, minha mente está cansada e esse jogo de sentimentos está me matando! Essa tortura sobre o que somos, ou seremos ou, ainda pior, sobre o que sentimos ou deveríamos sentir (ou não) está me matando. Essa morte não está lenta. Está dolorosa e os meus pedaços estão sendo expostos no ‘Museu dos Imbecis’.
Acho que vou me afastar por um tempo. Não sei quanto tempo, mas nada além do necessário para que eu entenda tudo o que está acontecendo comigo, o que está acontecendo em mim. Se a chuva cair antes de eu sair pode ser que não seja preciso... Mas ela deve estar muito longe, não me ouve...