Carta à solidão
Venho aqui nesse torto manuscrito escrever sobre meu vazio,
a quem possa interessar a pequenez de um grão de areia,
talvez apenas mais um lamento insano de uma noite de inverno,
palavras à qualquer um em qualquer lugar sem qualquer sentido,
procuro mais o silêncio do que vozes com quem dialogar,
meu interior ainda reclama emoções incontestes,
meus delírios assaltam-me em pesadelos acordado,
a realidade é tão difícil e os sonhos tão distantes,
como notas de músicas dedilhadas em um tempo tão remoto,
as melodias parecem ecoar dentro do meu eu perdido,
histórias de amores incompletos, de "eu te amo's" esquecidos,
ressoam em mim como o grasnado de um corvo inquieto,
enquanto ando sobre um arame entre arranha-céus,
a multidão torce para que a queda seja imediata e certeira,
e eu só desejo retomar minhas asas e voar direto ao sol,
como um filho bastardo de Prometeu buscar minhas raízes,
ou então cair de vez na solidão do abismo de uma vida triste,
talvez uma voz lá no fundo do salão diga: "eu te avisei",
abaixo de 7 palmos de terra repousa meu coração desvalido,
assassinado por mim mesmo em uma noite de dor intensa,
enterrado sob lágrimas de uma semana de chuvosa neblina,
agora sigo assim, errático, vivendo a ilusão de cada dia,
desejando que o amor de agora fosse suficiente para calar o grito,
esse ruído de memórias que se mantém tão presentes,
mesmo tendo eu trancafiado agonia e êxtase no cárcere de minh'alma,
nas desrazões do destino minha melancolia impera,
enquanto me despeço sem grandes esperanças,
desejando que a aflição humana possa se esvair dos meus tormentos,
sorrio na lágrima de ontem a insensatez de amanhã,
boa noite às almas que perambulam nesse deserto coletivo,
esbarrando em fantasmas que insistem ser pedras no caminho,
bom sono aos insônes da madrugada que aguardam o impossível,
adeus, sem para sempre, sem final feliz, sem beijos...