Diante de você
Querida amiga
Se carta tivesse título como num livro, esta seria: “diante de você”! Por quê? Bem... Poética-metaforicamente escrevendo poderia ser porque quem sofre o mal da saudade, não acha alívio num momento; pois tem perto a enfermidade e longe o medicamento. Numa linguajem menos trovadoresca e mais engajada poder-se-ia dizer que “diante de você” a mim lembra um mendigo batendo em porta de casa rica; mendigo incessante, filho da miséria, procura pão, busca amor. Onde achará pão para matar sua fome? Onde achará amor para viver sem pão?
Ainda bem que cartas não se intitulam. Assim sendo ninguém ouve na manhã silenciosa o grito da noite que morre. Todos dormem, o sol dorme. Eu, escriba, acordado, olho a noite, a manhã em lágrimas de orvalho, chorando gotas de aurora... Galos ao longe acordando o dia, mas ninguém ouviu o grito da noite que morria candidamente. Não sorria! Não é poesia! Poeta só poetisa quando percebe que poesia é muito mais que formas fixas ou lugares comuns. É agudeza pensada, raciocinada, que foge dos simplismos e das obviedades.
E então? A saúde como vai? Não vá perder a sua!
Aqui vamos bem. Graças a Deus que o ano está no meio. Daqui a pouco vai terminando, ou nós ou ele. Tem sido um tempo difícil: pássaros morreram no inverno, barcos partiram para o mar e não regressaram. O Deus simpático não habita mais “A cabana”. Que se vá... O novo ano será ainda mais desconhecido: 2012 de destino traçado por viúvas vestidas de negro cínico e como diz o apólogo de um rei da Inglaterra, às portas do ano novo darei a mão ao desconhecido que guarda sua entrada e entrarei na noite e dentro da noite verei mais claro se estivesse com uma luz. Se você quiser, faça a mesma experiência, prometo que não se arrependerá. Apesar das minhas palavras erradas, já não tenho os velhos poemas guardados, nem o medo; o mundo é nosso. Podia ser teu se quisesses
Afs! Diríamos na internet, não? Eu digitaria Rsrs. E você um adocicado kkkkkk!
Por uns dias estive sem internet. A torre do nosso provedor via Rádio desabou em meio a vendaval. Provedores há outros por aqui, mas o que eu usava o vento levou... Para não perder-me de ti resolvi enfiar a mão no bolso (ah como isso contraria a mineirice!) e contratei velox da Oi, net de luxo, última moda de Paris... Mas como nós mineiros nada mais somos que baianos cansados, a instalação do serviço levou 10 dias úteis, descontados os inúteis... Como me arranjei? Ora no escritório do contador o provedor é outro. Vou lá um poukim com um pretextim urgente qualquer, ele finge que acredita e cede o favor. Artimanha pra te encontrar que quanto mais explica mais complica. Mas achei importante deixar registrado o esquema do estratagema.
A pedidos estou vertendo para o italiano alguns textos de Gandhi. Faço com gosto mas me soa estranho frases de Gandhi tipo: Uma vita senza religione é come una barca senza timone. Ou: Il digiuno é per l´anima ció che gli occhi sono per il corpo. Não parece Gandhi, fica com jeito de frase de frade capuchinho. Jeito de Ghandi é o diálogo de Buda com Kapila no livro “O Cem-Cabeças” de J.L. Borges.
Desejo que você tenha tirado de letra o trimestre da faculdade de letras. Desejo que no próximo período você voe tranqüila e ligeira, como uma águia, entre os mundos literário-doméstico-profissional, mundos esses semelhantes a vôo de falcão ferido.
A folha de papel está no fim e gostaria de transcrever prá vc um trecho do “Pequeno Oratório de Santa Clara” de Cecília Meireles. Poderei mandar por-email...
O que não escrevo fica por escrever; o que não falo fica por dizer. Se eu tivesse que usar um símbolo para identificar você, seria no presépio da minha vida a Estrela. De vê-la chegar me maravilho e sinto-me ofuscado só de vê-la. Duvido haver outra de maior brilho.
Eis que sou vosso amigo...