Paiol Velho, sábado, 11 de junho de 2011.

Açucena,
agora são 07h:45min e li uma mensagem sua de duas da madrugada...  Olha só, Açucena, vê bem, àquela hora eu estava num sono gostoso pra daná, todo enroscado em mantas, e, se o apito do celular avisando que me chegara uma mensagem, se com ele eu desperto e no frio medonho levanto pra ler que você não consegue dormir, e depois então eu nem consiga mais conciliar-me com ele, com a dormida, se isso acontece, nossa, no meio da madrugada eu e Alfa nos despencaríamos praí e iríamos te azucrinar! Ora, pra passar o tempo, por que não sentou o rabo frente ao computador e me retornou os tantos e-mails que te enviei falando de filmes, de livros, de tilápia...?!
  Cansado de escrever e não ser correspondido — à Cony eu escrevo e escrevo e ninguém toma providências —, ou de ser lido apressadamente e assim desentendido, outro dia eu escrevi ao P. — extensivamente à P2., à F. e à M. — querendo saber por que me abandonaram. Disse não entender bem por que ficaram de mal comigo — afinal, eu não sou mau, apenas lhes narrei que fora espoliado pela minha vizinhança e pelo meu desirmão e, sobre estes episódios, sendo breve eu disse que alguns leram apressadamente os fatos que contei; afirmei, também, que não gostaria de ser amigo deles, de ninguém, através de sites de relacionamento — e expliquei o porquê —, mas queria ser, sim, ou continuar sendo, amigo por qualquer outro meio.
  Sem fazer-me de bocó desentendido, mas desentendendo mesmo, disse que insistiria em manter contato com eles, enfim são pessoas que tanto estimo. Sim, até que ao menos fossem explícitos e na minha fuça dizerem que me querem pra lá do escanteio de suas linhas. Se, por outro lado, mantiverem-se mudos com essa pessoa que ora lhes fala, como não sou beócio nem nada entenderei o não dito pelo dito. Aí sim, me calarei, porei um ponto final: “Fim”.
  Depois dum tempo, dos quatro uma só, como porta voz da patota e certamente conluiada aos demais, me diz assim:
Germino, não tenho nada pessoal contra você. O problema é que tenho pouco tempo e não gosto de ler e-mails longos por mais bem escritos que sejam. Acho que você tem mais tempo livre do que nós, do que eu com certeza. Raramente entro no e-mail e quando entro é coisa ´rápida pra ver alguma resposta ou perguntar alguma coisa, mensagens com no máximo 3 linhas. Sei que o P está sempre correndo. Em resumo, é isso o que acontece.
Bj
P2.

  Tá, tá bem, P2, vê se engulo essa. Num entra no e-mail e fica de lero-lero no “livro das faces” cheio de dicção e dialeto abreviado (vc, tb, bj...), é, naquele site de relacionamento pra carências afetivas. E eu num sei! Você já me chamou pra lá eu ser mais um de seus amigos, e eu disse que não, que ali não, e disse por quê.
  Não tenho um liquidificador falante como o da Elvira, num tenho não; sim, mas tenho a Alfa mais Dudu e juntos assobiamos quintanares: “Todos esses que aí estão/ atravancando meu caminho,/ eles passarão.../ eu passarinho!”, e infelizmente concluímos que “esperança é um urubu pintado de verde”. Aí nos ajuntamos à Cecília Meireles e soltamos a voz de Xangai: “Todos querem ser pastor/ quando os carneirinhos já estão bem enroladinhos/ como carretéis de lã...”.
  É isso, P2, meu ailóviú, nóis é jéca mais é jóia.
  Não, Açucena, não lhe retornei isso não, dessa maneira, eu hein! — sou malcriado mas nem tanto —, num quer conversar comigo, ora, não converse q’eu também me calo, literaturo ensimesmando-me. Apenas encasquetei a ideia, até por que a dona só lê “mensagens com no máximo 3 linhas”, e assim, numa leitura apressada, a minha fala abundante ficaria mais uma vez pra lá de truncada. Numa dessas, pelo meu desirmão eu já fui tachado de misantropo, adjetivo que desconhecia. Tô fora...
  Germino

Germino da Terra
Enviado por Germino da Terra em 01/07/2011
Reeditado em 12/08/2011
Código do texto: T3069354
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