CARTA À GIOCONDA

“Tocar na afetividade feminina

– feliz acidente de percurso do domínio masculino –

quer dizer se aproximar dos sussurros intermináveis das coisas”

Walter Von Rossum

Areia Branca, B.R/R.J 18 Jan 05

Querida menina (que insistirei tratar por Castor, comparando-a, a Simone de Beauvoir, enquanto não for isso desagradável para ti),

O que você quer que eu faça, ainda? Se já traí a mim, nas convicções que criei e espargi com alarde.

Sinto dor por isso – não menor é claro que a excitação deste nosso negócio. Traindo, também estou, um amigo (e por isso disse que traía a mim) – E tento enfim convencer-me, diante de tuas palavras e argumentos, e também de minha própria vontade e do desejo que se forma a partir dela, que é preciso – O mundo se deixou dominar com a energia destrutiva da vontade – A vontade é a verdade. Por que então, salvá-lo, se já é perdido em querer?

Não há medo em minha ação. Nem arrependimento. Só a certeza da traição. Será erro?. Buscando ser perspicaz até o fim e não encucar com o belo: “Eu tenho me morrido lentamente. Até reagir num súbito instante, pulsando vida. Até novo morrer lento” .

O que nos tornou tão atraentes? Será o simulacro pseudo-intelectual de nossa conversa afiada e distante? Ou o tom excitante que dilacera, meu instante?

Estou comovido e convencido. Também quero este momento: E não se perca em pensar que sou ou serei apenas sério e sincero, pois que, não me sai da cabeça que lateja a tua testa molhada , a todo instante.

Paz Profunda

Sylvio Neto

(Se tu é Castor, serei eu, teu Sartre)

Sylvio Neto
Enviado por Sylvio Neto em 02/07/2005
Código do texto: T30086