SOBRE O TEMPO

Não se assuste a minha Leitora Especialíssima com o conteúdo filosófico deste texto, ele é um tanto chato para quem não está acostumado, mas eu reputo necessário para dar-lhe uma noção de meu sentimento sombrio neste final de semana.

Você entenderá, tenho certeza de que vai compreender.

Dito isso, uma das coisas que mais intrigam o ser humano desde épocas imemoriais é o tempo.

Afinal, pois, o que é o tempo?

Ele existe? Do que é feito, onde ele está, que diabo é isso que está tão intimamente ligado a nós contudo não temos uma noção exata do que seja?

Santo Agostinho dizia que ele sabia o que era o tempo, mas se quisessem que ele o explicasse, já não poderia fazê-lo.

Há pessoas que ingenuamente pensam que o tempo é aquele do relógio, mas esse tempo do relógio é simplesmente uma convenção necessária e arbitrária para que possamos controlar a vida.

Criado com a Revoução Industrial, o relógio com precisão de minutos e segundos tinha por fim controlar a vida dos funcionários das fábricas.

Para mim, a melhor definição ou tentativa de se explicar o que significa o tempo vem do filósofo alemão Immannuel Kant (1724-1804).

Na sua opus magna, ‘Crítica da Razão Pura’, o filósofo de Königsberg afirma que o tempo não existe como coisa em si, ou seja, não é possível que exista o tempo separado de uma consciência humana.

O tempo, para Kant, é uma disposição que o sujeito do conhecimento coloca nas coisas para conseguir compreendê-las. Isto é, somente compreendemos todas as coisas que acontecem conosco porque temos uma noção interna do tempo.

Assim, necessariamente tudo o que percebemos está ligado ao tempo. Um evento ocorre simultaneamente ou sucessivamente, e a minha querida leitora, aliás queridíssima leitora, somente consegue organizar o mundo que se abre em frente aos seus olhos porque possui em si ‘equipamentos sensoriais’ que permitem que se perceba o mundo assim, com noções de tempo e também de espaço.

Para Kant, o tempo é a priori, ou seja, antes de experimentarmos qualquer coisa, a noção de tempo já é intrínseca em nós, como um equipamento de fábrica para compreendermos o caos do mundo.

Mas, depois dessa resumida exposição do tempo em Kant, eu tive, neste sábado, uma experiência do que vem a ser realmente o tempo, da sua demora e da sua agonia.

Eu fiz tudo o que deveria ser feito, ou seja, a manutenção da minha vida animal, o lavar os pratos, a roupa, visitar a filha, enfim, toda a burocracia da minha vida foi feita e eu finalmente sentei-me no sofá.

Foi então que a alma começou a reclamar.

Sozinho na casa, sozinho na vida, eu olhava para o relógio e esse demorava a passar. Sentia-me sem turma, sem amor, completamente desamparado. Olhava para o celular por várias vezes na vã tentativa de ser surpreendido por uma ligação de alguém especial, de uma voz amiga chamando-me para algum programa bacana, mas nada acontecia.

Acredito que pela primeira vez me senti completamente só.

Não acreditava eu nas histórias de sofrimento das pessoas solitárias, na sua agonia, no sentimento ruim de se saber sem ninguém. Nem eu sabia que era assim tão dependente da companhia das pessoas, principalemente de uma pessoa em especial.

Percebi que o filósofo alemão está certo, o tempo é uma experiência, ou seja, percebe-se o tempo por meio de nossa sensibilidade.

A minha sensibilidade percebeu que o tempo passou devagar, que eu estava só e que a vida dura pouco. Além da percepção do tempo, este também age sobre nossos corpos nos trazendo necessariamente a decadência e a morte.

Desculpe a minha Leitora Especialíssima pelo tom um tanto melancólico deste escrito. Em verdade é somente tristeza, e ele não comporta nenhum ressentimento nem culpa ninguém de nada, absolutamente.

São sentimentos meus que nem mesmo eu consigo controlar.

É que quando uma pessoa especial não está ao seu lado, o tempo realmente fica mais demorado, suas horas são mais burocráticas e chatas, tamanha a falta que esta pessoa especial faz na nossa vida.

Era somente para compartilhar contigo essas coisas que são difíceis de dizer pessoalmente.

Peço ao tempo que não me castigue mais fazendo com que eu o perceba assim tão demorado.

Um beijo para minha Leitora Especialíssima.

Frederico Guilherme
Enviado por Frederico Guilherme em 22/05/2011
Reeditado em 22/05/2011
Código do texto: T2985875
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