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De amizade, de sinceridade


Querida Flor


            Inicio pedindo desculpas, pois entre amigas e amigos os silêncios incômodos não são silêncios construtivos. Liguei para o seu nº algumas vezes, mas quando senti que não haveria retorno, desisti, visto que não é de  minha natureza impor minha presença a quem quer que seja, mas também não é de acumular equívocos, mal-entendidos, ruídos de comunicação.
              Você me procurou e me sinto no direito de continuar a reflexão a partir da sua reação... Flor, sinceramente, quando abriu seu coração, quando perguntou minha opinião, queria mesmo ouvi-la ou queria apenas que eu concordasse com a sua?
            Lamento tê-la decepcionado, mas se me conhecesse um pouco como eu achava que conhecia saberia que eu não concordaria com a opinião se quem se utiliza do artifício da chantagem emocional, da autopiedade, para resolver qualquer situação.
           Você disse: - A verdade é que eu amo demais, não acha?
            Eu respondi: - Não. Acho que você ama errado... Você  não se respeita, não se ama, como quer que o outro lhe respeite e ame  na mesma medida?
            Relações de amor e convivência se esgarçam, desgastam, acabam. A de vocês não será a primeira, nem a última, infelizmente.E minha opinião, que tanto lhe desagradou, foi de que seu comportamento autodestrutivo muito contribuiu para isso.
            Desculpe também se externar que você precisa de ajuda lhe ofendeu. Vontade de amar, de ser feliz todos têm , mas além da vontade é preciso ter disposição para se colocar no lugar do outro, para ouvir e compreender as nossas próprias limitações e a de quem conosco caminha .E eu reconheço que não é nada fácil...
            Vou entender se se afastar, mas vou lamentar, pois acho mesmo que precisa de ajuda quem sabota a própria possibilidade de ser feliz, quem, no seu destempero, não ouve ninguém, não mede o que diz e logo após apela para a chantagem emocional, para o choro, para as cobranças descabidas. E não se engane: o “amor” que suporta viver nesse pé de guerra não é amor.
             Amar se aprende amando, Flor e não é só citação poética. É verdade aprendida na trajetória de quem se dispõe, se abre para viver. Quis saber da opinião de uma mulher com um pouco mais de idade que você, que nunca teve medo de viver o que lhe cabe, nem de refazer o caminho, quando preciso, e teve-a.
              Está claro que entendemos a vida e o amor de modo diverso. Penso eu que o amor deve nos tornar melhores, mais leves, mais comprometidos com a vida e não é salvo conduto para nos arvorar a ser carcereiras do afeto, controladoras do que pensa, sente e sonha quem amamos. A posse quase sempre é uma armadilha, pois o que separa o “pertencimento afetivo” do se achar “Dona/a e Sra./Sr.” da alma do outro é um fio tênue.
             Desculpe o mau jeito, Flor. Meu carinho, meu ombro e meu ouvido sempre estarão á disposição da nossa amizade, mas permita-me dizer que devemos repensar que amizade é essa que não suporta o peso de uma opinião contrária... Pessoalmente, vou ratificar que amizade, sinceridade, afeto, sentimentos e  valores que tanto defendo e preservo, não são “roupa” de ocasião.

Abraço, Flor.
 
 
 
Da série CARTAS PARA UMA FLOR...