A Última Carta
A ÚLTIMA CARTA
Nada mais tenho a te dizer, senão falar da tristeza que restou desta nossa caminhada que já chega ao fim. A estrada acabou. Chegamos ao seu limite. Nosso horizonte perdeu-se nas brumas da incompatibilidade dos nossos pensamentos. Os anos pesaram e força nos faltou para darmos mais alguns passos à frente, em busca de algumas gotas de felicidade que pairassem na atmosfera pesada que nos envolveu, pois a vida já não tem mais graça. Nada mais sorrir para nós. Não há mais os sóis brilhantes que iluminaram os nossos primeiros dias. As nossas manhãs tornaram-se invernosas e as noites se fecham na escuridão do nosso indiferentismo. E eu fico a imaginar que tão bom teria sido se tudo tivesse terminado como foi no começo, quando o amor parecia florescer, dando frutos para o futuro (que não floresceu), fazendo de nós, como desejei, um casal modelo, exemplar, um paradigma para outros que também caminham para os dias das incertezas da velhice. Aquela parceria, o companheirismo, a cumplicidade, os mesmos desejos pareciam florir o nosso jardim, no início, naquele momento em que plantamos tudo aquilo naquele “10 de janeiro de 1959”, que não esqueço, que já vai longe, que hoje em dia se encheu de flores e folhas murchas e retorcidas, levadas pelos ventos da nossa frieza, envolvidos que fomos por momentos tempestivos. A calmaria pouco durou. Quando houve, foi maravilhoso. Sonhávamos acordados. Havia beijos e abraços, trocas de meiguice, palavras doces. Hoje, lamentavelmente, só há críticas, imperfeições e... impropérios. As nossas virtudes nisto se transformaram. Somos, na verdade, apenas dois que não se compreenderam, que não fizeram justiça um ao outro, que não nos conhecemos verdadeiramente, mesmo em todos esses anos vividos. Enfim, faltou afeto, pois não soubemos trocar um com o outro. Não soubemos ser felizes. Não demos certo. É a verdade. Nada mais tenho a te dizer, a não ser que a morte, muito em breve, vai nos levar. Ou a mim primeiro, ou a ti, quem sabe? E assim, para um de nós que ficar, talvez reste a lembrança (ou a saudade) que nos leve a acreditar que o verdadeiro amor, se tivesse existido, teria evitado o terremoto que destruiu boa parte da nossa convivência. E aquelas almas-gêmeas que parecíamos ser de início, talvez arrependidas, continuem juntas no Céu, nos festejos dos anjos, arcanjos e querubins, se Deus, na Sua infinita bondade, perdoar as nossas ofensas! Ou a morte será mesmo o nosso merecido castigo. Esta, então, é a minha última carta. Rasgue-a, destrua-a, como bem fizeste com outras que te enviei. Seja feliz. É o que te desejo!
A ÚLTIMA CARTA
Nada mais tenho a te dizer, senão falar da tristeza que restou desta nossa caminhada que já chega ao fim. A estrada acabou. Chegamos ao seu limite. Nosso horizonte perdeu-se nas brumas da incompatibilidade dos nossos pensamentos. Os anos pesaram e força nos faltou para darmos mais alguns passos à frente, em busca de algumas gotas de felicidade que pairassem na atmosfera pesada que nos envolveu, pois a vida já não tem mais graça. Nada mais sorrir para nós. Não há mais os sóis brilhantes que iluminaram os nossos primeiros dias. As nossas manhãs tornaram-se invernosas e as noites se fecham na escuridão do nosso indiferentismo. E eu fico a imaginar que tão bom teria sido se tudo tivesse terminado como foi no começo, quando o amor parecia florescer, dando frutos para o futuro (que não floresceu), fazendo de nós, como desejei, um casal modelo, exemplar, um paradigma para outros que também caminham para os dias das incertezas da velhice. Aquela parceria, o companheirismo, a cumplicidade, os mesmos desejos pareciam florir o nosso jardim, no início, naquele momento em que plantamos tudo aquilo naquele “10 de janeiro de 1959”, que não esqueço, que já vai longe, que hoje em dia se encheu de flores e folhas murchas e retorcidas, levadas pelos ventos da nossa frieza, envolvidos que fomos por momentos tempestivos. A calmaria pouco durou. Quando houve, foi maravilhoso. Sonhávamos acordados. Havia beijos e abraços, trocas de meiguice, palavras doces. Hoje, lamentavelmente, só há críticas, imperfeições e... impropérios. As nossas virtudes nisto se transformaram. Somos, na verdade, apenas dois que não se compreenderam, que não fizeram justiça um ao outro, que não nos conhecemos verdadeiramente, mesmo em todos esses anos vividos. Enfim, faltou afeto, pois não soubemos trocar um com o outro. Não soubemos ser felizes. Não demos certo. É a verdade. Nada mais tenho a te dizer, a não ser que a morte, muito em breve, vai nos levar. Ou a mim primeiro, ou a ti, quem sabe? E assim, para um de nós que ficar, talvez reste a lembrança (ou a saudade) que nos leve a acreditar que o verdadeiro amor, se tivesse existido, teria evitado o terremoto que destruiu boa parte da nossa convivência. E aquelas almas-gêmeas que parecíamos ser de início, talvez arrependidas, continuem juntas no Céu, nos festejos dos anjos, arcanjos e querubins, se Deus, na Sua infinita bondade, perdoar as nossas ofensas! Ou a morte será mesmo o nosso merecido castigo. Esta, então, é a minha última carta. Rasgue-a, destrua-a, como bem fizeste com outras que te enviei. Seja feliz. É o que te desejo!