MEUS PÊSAMES POR VIVER

Meus pêsames, você está viva!

Particularmente acredito que a palavra pêsames se ajusta melhor a quem está vivo do que ao parente de quem morreu, pois “a morte é o oceano coletivo da tranquilidade”.

Ouvi esta frase da boca de um admirável psicanalista.

“Oceano coletivo da tranquilidade”! Haverá algo mais desejado, mais refrescante, mais confortável, delicioso e fresco do que a nossa tão sonhada tranquilidade?

E nisso, cara leitora, é preciso concordar com o douto psicanalista porque a vida é o verdadeiro avesso da tranquilidade. Nada mais intranquilo do que viver, nada mais cansativo e desconfortável do que habitar este corpo putrescível.

Mas fiquem calmas minhas leitoras amigas, apesar de compreender os suicidas, não tenho intenção de dar cabo na minha cansada vida; falta-me coragem para tanto.

Os meios para se suicidar aparentemente não são nada agradáveis, portanto deixemos que a vida cumpra com seu inexorável papel. Tenho paciência para esperar a bancarrota vir por si só.

E é isso minha amiga, que tenho para te dizer hoje, que viver é sinônimo de desconforto contínuo. Digo mais, vou além, um intenso, contínuo e perpétuo mal estar, uma náusea de ser e de estar aqui entre os seres animados.

Praticamente o tempo todo há pelo menos alguma coisa em nossa vida que nos incomoda. Sempre, é só prestar atenção em você mesma, caríssima leitora.

Por exemplo, a temperatura.

Ora o calor é excessivo; a desagradável sensação de suor correndo pelo corpo, deixando-o todo molhado e logo após grudento, para terminar num cheiro desagradável.

Outrora, no frio, os dedos ficam duros, os lábios racham, a pele se resseca, tomar banho torna-se um desafio. Acordar pela manhã, que para mim é uma das piores sensações que alguém pode experimentar, fica ainda mais difícil na estação gelada.

Mas que pessimismo terrível!

Calma, leitora, só estamos começando. A nossa sessão “desconforto de viver” tem ainda muito o que dizer.

E por falar em desprazer, não é só a temperatura que nos atormenta o tempo todo. Quem já não experimentou uma dor. Uma enxaqueca, por exemplo, não é uma delícia? E dor de dente?

Dizem que dor nos rins é terrível. Ouvi de um amigo que faria qualquer coisa para passar sua dor nos rins; e ele frisou bem: “Sou capaz de qualquer coisa, qualquer coisa!”.

Temperatura, dores... Pensa que parou por aí? Que tipo de sofredora você é?

A cabeça além de doer de maneira física, dói na forma da preocupação, da angústia, da tristeza, do tédio, da agonia, do pânico, do desespero, da ansiedade... Famosos males d’alma.

Assim, o trabalho de viver, toda a faina que é a vida, toda a sua atribulação e necessidade de constante manutenção é ainda incrementado por um constante e interminável desejo de tudo.

Deseja-se tudo, desejamos amor, que nem sabemos direito o que é, e quase sempre nos frustramos; desejamos felicidade e a danada nunca se apresenta, desejamos riqueza e quando a alcançamos nos vemos frustrados com a sua vacuidade; desejamos sentido para a vida e nunca conseguimos defini-lo de maneira plena, satisfatória; desejamos constantemente todas as coisas, e mesmo conseguindo o que queremos, sempre haverá alguma coisa faltante.

Viver dá trabalho, aliás, um enorme e penoso trabalho. Nem sei se vale à pena tudo isso, toda essa chateação que parece não ter fim.

Da próxima vez que vermos alguém num caixão devemos ficar felizes por esta pessoa.

Ela finalmente está plenamente confortável, completamente tranquila, privada para sempre dos males da vida e de todos os seus percalços.

Obviamente, querida leitora, que eu poderia escrever um tratado de seis volumes sobre o sofrimento, sobre todo mal da vida, sobre todo o seu desconforto e fastio, sou escolado nisso tudo.

Contudo, seria muito doloroso e cansativo, além de ser economicamente inviável; tenho certeza de que apenas meia dúzia de pessoas iriam ler essa sinfonia do pessimismo.

Deixo espaço para que vocês reflitam sobre essa aventura ingrata da vida que, ponderando sobre um valor de 100%, talvez uns 2% valham à pena.

Meus pêsames para você e para mim que ainda respiramos.

Obs. Não, leitora amiga, não li Schopenhauer nos últimos dias, é a vida mesmo que tem se apresentado para mim, quase sempre mostrando os dentes e rangendo.

Frederico Guilherme
Enviado por Frederico Guilherme em 16/02/2011
Código do texto: T2796259
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