Amizade Estelar

Muitas vezes tentei ir embora do lugar onde imaginei só nosso. De cada vez que arrumava a tal bagagem imaginária, esbarrava nas lembranças deste nós, que verdadeiramente jamais existiu.

Conhece a sensação de nada sermos quando estamos no escuro? Um mundo que silencia e se apaga, enquanto permanecemos ali imóveis, com uma mão ausente de tudo e outra repleta de nada.

A princípio não sabemos aonde ir e tudo o que pudermos pronunciar, seja uma prece ou o nome ausente, parece inútil, o som morre na garganta, escoando num abismo sem ouvido.

Dia houvesse em que nos esquecêssemos recostados ao amontoado das lembranças, poderíamos nos reencontrar nas páginas de um livro recheado de ausências, seria demasiado fácil reconhecer-nos.

Era como se a qualquer momento uma página virasse e uma janela se abrisse, dali poderia acenar enquanto refletia sobre o que lia.*

Os dedos de uma mão marcavam firme a folha, o olhar perscrutava a alma em busca desse algo distante e imponderável, um tudo que se assemelhava com a quase proximidade que desfrutamos um dia.

Neste amanhã, como ontem, como agora, pairamos num meio, num quase, e no infinito se estabelece a certeza de que será sempre assim, mas nada dói. Apenas nos tornamos mutuamente previsíveis e capazes de nos encantarmos na mesmice.

Já não existe a inquietude de antes, aprendi que em cada reencontro somos cada vez mais bem-vindos um ao outro. Uma amizade que por vezes se confunde com amor.