Non, rien de rien.

Você não saberia me dizer como é estar ou ser como estou ou sou. Não é como se eu alcançasse o céu e o inferno, não é como se eu estivesse parada na terra, muito menos como se eu oscilasse entre os extremos. A verdade é que estou pairando, ou melhor, vagando, por algum local no meio, sem nome ou descrição. Vagando sim, pairando não, porque pairar é algo tão positivo, admirável e leve que é o completo oposto do que estou vivendo. Vagando lentamente e sem forças para decidir-me entre subir e descer. Mas, sei bem eu, que no ponto onde cheguei ainda há volta, mas, cansada como cá me encontro, sei também que nunca irei escolher subir, a luz queima a minha vista acostumada com a escuridão involuntária.

Se alguém encontrar o que escrevo sei que nunca me deixarão sair daqui. Julgam que tentei me matar, mas não é por isso que me machuco, não é para a morte e sim pela vida, aquela que quero sentir, pela auto-punição por todos aqueles que fiz chorar sem nem ao menos me importar, pela minha apatia e falta de resolução. Mas aqui não ajo mais assim, já que retiraram do meu quarto todos os objetos com os quais eu pudesse me infligir dor, logo após a primeira vez que me ataquei por tentar me fazer entender que eu deveria estar mau por estar aqui.

Agora, um ano depois, restaram poucas cicatrizes, as quais, em sua maioria, são as do dia que me trouxe até aqui. Elas só existem por causa de um jogo que joguei comigo mesma. Para cada cena triste, torturante, negativa de uma maneira geral, que assistisse e não chegasse nem ao menos a estremecer, seria uma dor equivalente que haveria eu de sentir. Depois do quinto vídeo, aproximadamente, perdi a conta e algum tempo depois a consciência. Acordei aqui, nesse hospital que não faço a questão de dizer o nome. Não sei quem paga já que para mim não há mais ninguém. São só detalhes, não importam. O que me fará falta deste lugar, com certeza será a alta dosagem de calmantes legais ou ilegais nos quais eu despejo a culpa do meu não me mover.

Falo sobre saudade porque hoje é a última sessão com o terapeuta infeliz que admitiu derrota diante a minha fraqueza e que sorriu, juntamente a mim, quando percebeu que estava disposta a colaborar se eu pudesse sair daqui.

Gostaria apenas de uma certeza ter. De que lá fora tudo continuaria igual. Eu e o meu silencio, a minha solidão, a minha vida e o meu livre arbítrio. Foi difícil me acostumar com o ‘tudo’ obrigatório deste lugar, quero apenas voltar ao meu isolamento voluntário. Talvez o querer tudo do meu jeito, e querer tudo que é meu somente para mim sejam as emoções mais fortes que eu consigo ter. acredito que foi aí que tudo começou.

Quando perdi algo valiosamente meu, algo do qual nunca deveria abrir mão, quanto menos deixar morrer. E esse algo valeu pela minha vida, deixar todas as minhas partes morrerem seria pouco perto de ter ficado parada observando paralisada e sem culpa ou pesar o “assassinato” que cometi. Aí comecei a vagar, mais uma auto-punição. Fiz valer como verdade.

E se volto para ‘casa’, volto com apenas uma intenção: terminar o que não consegui. Traçar o limiar da dor. E se este for a morte? Assim será.

Eduarda Daibert
Enviado por Eduarda Daibert em 05/10/2010
Código do texto: T2538316
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