13° Andar
Quando eu te falei que eu tenho preguiça de pessoas e você falou que também tem o destino bateu com seu martelo selando uma época nova, talvez frutífera ou cheia de ignomínias. Sabe, enquanto você me dá as costas se remoendo com seus enjôos eu tento achar um pensamento que me ajude a debelar essa ressaca e rolo de um lado pro outro na cama; me encaixo em você na conchinha quente, enfio a cara no vão entre a parede e o colchão, jogo as pernas pro alto, fico de quatro, olho as luzes dos carros no teto e parece que nada dá certo. É estranho que, quando a gente se encontra, ou estamos bêbados ou levemente bêbados ou de ressaca. Presumo que nossas faculdades mentais, logo, nunca estão em ordem e nossa cognição sempre terá o véu da ebriedade ou do mau humor. E o estranho é que isso me traz paz; um caos pacífico; um mergulho na paz. Não dá vontade nem de ir no banheiro tirar essa camisinha suja que tá pendurada aqui embaixo tem mais de duas horas. É tudo meio que complexo e simplório ao mesmo tempo: a gente pede comida pela internet enquanto eu sujo seu colchão com sêmen. Enquanto minha cabeça lateja e eu quero morrer eu me sinto compelido a, de novo, arrancar a sua roupa e te sorver até a alma. Não quero encheção de linguiça às três da tarde; desligo o celular. Quero você, só. Quero ficar dentro de você de muitas formas; como a imagem de alguém que atravessou a cidade pra te acompanhar por algumas poucas horas; dentro de você com meu órgão genital e com a minha língua na sua boca ao mesmo tempo; quero queimar a sua vela dos dois lados. Quero que você me consuma, me sugue, me chupe, me deixe endemoniado no auge do tesão e me deixe com ares querubínicos enquanto resfolego semi-morto no seu colo, te olhando nos olhos e me pergunto como uma transa pôde ser tão bem feita e ter te colocado no mundo com um sorriso desses, que me derrete o coração que considero ter se transformado em rocha. Vou até a janela e olho lá pra baixo. Chove e o cinza dos prédios velhos ganha uma tonalidade mais escura. Sobe um reconfortante cheiro de terra molhada. O céu vai ficando mais escuro, carregado e você só emana energias boas. Não sei, me dá uma vontade de consertar a minha vida. Sempre tem alguém que aparece e transmite essa vontade. E este sempre é bem esporádico; não é sempre que este sempre aparece por essas bandas. E é ai que eu vejo que há algo errado: o certo aparece. E o certo, depois, dá errado. Sempre dá errado. Não, não é pessimismo, é calejamento, é muito chute na cara. Que se dá e que se leva. É por isso que o coração vira ônix. E esse sorriso, hein? Ele bate aqui dentro como o mar bate no pé da montanha; o torvelinho volta, os grãos se transformam e caem e a maré os leva para Poseidon fazer o que bem entender; jogar na praia pra alguém pisar ou ancorar no fundo do mar para ninguém mais tocar. É, não nos conhecemos nem de longe, mas temos uma sintonia que nos deixa íntimos. O tempo é tão curto e as horas são tão opressoras com a sua rapidez, aqui, neste quarto, nesta cama, nesta vida. Logo os compromissos chegam com o raiar do dia, e quando o sol aparecer já estaremos longe um do outro, talvez por um dia ou dois, ou por um mês ou dois, ou por uma encarnação ou duas. Aproveito isso que eu implorei pra ter e por vezes se desgasta pra voltar pra cama, afastar a carteira, a meia, a calça, o celular desligado e os travesseiros e simplesmente te contemplar, olhar, admirar, sorrir pra você, fingir preocupação quando estou na maior das tranquilidades ou fingir tranquilidade quando estou na maior das preocupações. O mundo lá fora não existe. As contas não existem, nem a internet com seus Deliverys e nem o IPod trazendo Nova Iorque até aqui. Consigo esquecer de tudo nesse intervalo que nos foi permitido ficar. Menos dos hics que te trouxeram até mim; menos do 0169. Também não consigo esquecer da sua dor, nem de como você dormiu no meio da nossa primeira transa. E se o agora em que escrevo isso for o derradeiro nosso momento, nossa derradeira experiência, eu traço dois paralelos, o antes o e depois: você entrou na minha vida bêbada e saiu dela de ressaca. E eu definiria o que tivemos como um belo porre. Então toquemos nossos copos num brinde à nós - seja lá o que "nós" significar. E é isso, Madaloft.