Casa sem avô
Tudo já não tem mais aquela alegria, a partida perdeu a euforia, a viagem perdeu o deslumbramento, a chegada perdeu a emoção, os passarinhos não cantam mais com tanta vontade, as plantinhas e as flores não têm mais aquele cheiro.
A casa de avô se tornou um lugar cheio de lembranças; das cosquinhas, das discussões sobre coisas do mundo, ele sempre ganhava, de travessuras no tanque, nas poças de lama da chuva, na matança das pobres borboletas, ele detestava.
Era o sonho mais esperado das férias, ir para a casa dos nossos avos, de curtir o verão nas matas, nos umbuzeiros, atrás das galinhas.
Os primos que moram lá têm, a travessura no olhar, a força de um caipira, a coragem de um cavaleiro, como nas historias de Lancelot. Minha avó matava uma galinha, limpava, e ia cantarolando para a cozinha, parando às vezes para juntar os tições, mas sempre com uma alegria no olhar.
Hoje ela não canta mais, levanta a noite e sai para o quintal, para chorar a partida do meu avô, já não tem aquela alegria no olhar, já não canta no fogão.
E eu penso varias vezes antes de ir lá, na sua casa, tentando fugir não das lembranças, mas daquela cruel falta de vida, de emoções que o meu avô criava tão facilmente, da sua vivacidade, de seu olhar de menino levado.
Ele se foi como um passarinho que plena vôo para o desconhecido, deve ter ido para um reino encantado, onde o sol brilha todos os dias, e as flores soltam doces bolgáris.