Vestes de luz
Anjo, outro dia achei ter lhe visto, mas logo pensei: estou pra lá de louco mesmo. O que estaria você fazendo neste mundo tão vazio de luz e tão vasto de dor? Sua alva veste não combina com o cinza e a putrefação destes pensamentos, onde por várias vezes tombo sobre eles, uma lama pesada me faz arrastar a carcaça por caminhos sem fim. Algumas árvores nuas e raras lembram o mundo que deixei tristemente; diria, tê-lo sim, abandonado ou desertado, como queira, guerras internas também devem valer alguma coisa neste pesadelo permanente. Reconheço ao longo desta estrada alguns rostos, que mesmo disformes, são particularmente ligados á mim por dores e rancores, pelo ódio ou pela traição...enfim, são tantas as opções, que o valor de qualquer afeto seria uma imprudência aqui neste labirinto de horrores e sonhos ruins. O maior peso que tu imaginastes existir na Terra, garanto, pesa mais a minha alma este sentimento de culpa. O orgulho não me permite lágrimas, pois aprendi com os poderosos que homem não deve ser fraco. E que orar é para os débeis e fanáticos, portanto não me curvarei diante destes humildes de alma. Acumulei riquezas e construí um império de luxo, porém ele parece não existir aqui neste mundo. Minha mente confusa não distingue o ontem do hoje. Tantos foram os que me apoiaram nos desvarios de meus dias de poder e agora me vejo tão solitário. Ao meu lado somente quem eu prejudiquei de alguma forma a me perseguirem, num infinito ranger e lamentar. Uma lágrima corajosa brota-me dos olhos e desato num choro sincero de arrependimento, fazendo uma oração meio sem jeito, mas tão honesta como nunca em minha vida fui. Diante de mim, com suas vestes de luz, o Anjo que pensei ter avistado outro dia. Abraça-me e faz com que eu adormeça deste pesadelo, pra que um dia eu acorde com a oportunidade nova...e renasça.
Autor Desconhecido