Carta de uma mãe às suas filhas
Para Daniela, Juliana, Carolina e Isadora (in memoriam)*.
Filhas, ontem celebramos “o dia das mães” e, como sempre, vocês encontraram diversas formas para expressar o amor que sentem por mim. O café da manhã na cama, as palavras de afeto e reconhecimento, o presente, e principalmente a presença alegre, cúmplice e harmoniosa, que para mim tem valor inestimável.
Claro que gosto das manifestações de carinho e apreço; no “dia das mães” e também em todos os outros dias do ano, quando brotam espontaneamente do coração de vocês. Tudo isto é importante, mas vocês me presentearam com algo maior: a maternidade.
Sempre soube que queria ser mãe, embora nem sempre tivesse consciência do que isto implicava e dos desafios que enfrentaria no exercício da maternidade. Mais do que em qualquer outro papel, vi meus ideais de perfeição irem um a um por água abaixo e me confrontei com a minha sombra (a mãe exigente), com as minhas limitações como pessoa, mulher e estive às voltas com as mais terríveis culpas. Coração apertado, lágrimas, frustração e decepção comigo mesma por não ser a mãe que idealizei: perfeita e infalível. Cobranças intermináveis em relação aos momentos de impaciência e indisponibilidade. E foi justamente o aspecto mais difícil, o sabor amargo que não me abstive de provar, que me impulsionou no meu processo de desenvolvimento pessoal.
Aprendi com vocês inúmeras lições. Sentidas na pele, nas entranhas, no coração. Deixaram marcas, cicatrizes, feridas - em mim e em vocês. No corpo e na alma.
Na tentativa de não cometer os mesmos erros que julguei terem cometido em relação a mim, cometi outros e novos erros e mais, não consegui evitar cometer alguns daqueles.
Acolher meus erros e equívocos, sem negá-los nem escondê-los, aceitar minha imperfeição e minhas limitações me fizeram mais humana, menos orgulhosa, menos arrogante, menos presunçosa, menos pretensiosa e mais consciente da minha sombra e da minha luz, dos meus dons e potencialidades, da minha capacidade de nutrir e destruir.
Sinto-me hoje mãe e pessoa melhor do que já fui e devo isto, dentre outras coisas, a vocês e ao pai de vocês, pela coragem de se entregarem e compartilharem a vida, por não desistirem nos momentos difíceis, por me amarem sem restrições e apesar de tudo. Por acreditarem, como eu, que muito maior do que a dor que nos vincula é o amor que une as nossas almas.
Vejo em vocês os reflexos do que não consegui transformar e superar em mim, mas a culpa quase não me visita. Vejo a luz de vocês e confio na possibilidade que têm de re-significar cada vivência, transformando em pérolas o que quer que tenha “sujado” os seus corações. Confio que as minhas qualidades maternas, independentemente do significado delas para cada uma de vocês, possam curar o que foi contaminado nas nossas relações.
Vocês são filhas queridas, amadas, belas e íntegras. Cada qual expressando uma qualidade especial e trazendo um desafio próprio. Vocês têm me proporcionado alegrias, ensinamentos e gratificações incontáveis - justamente por serem quem são - cada uma do seu jeito e da sua forma.
Que vocês possam honrar suas naturezas e seus propósitos para esta vida, não esquecendo que são irmãs, frutos da mesma árvore, sangue do meu sangue.
Agradeço a Deus, ao pai de vocês e a cada uma, pela dádiva da maternidade.
Com todo o amor do meu coração,
Sua mãe,
Norma Suely Braga Facchinetti em 15 de maio de 2006
* Hoje é aniversário de 15 anos de Isadora, minha filha caçula, que tão rapidamente passou por esta vida e tanto me ensinou. Filha que vai permanecer sempre viva no meu coração e nas minhas orações.
Publico esta carta em 06 de maio de 2010, como celebração do seu aniversário.
Com amor, gratidão e saudade.