Uma carta no natal
Meus filhos,
Estou mandando esta cartinha cheia de saudades. Gostaria que vocês estivessem aqui para verem as luzes da cidade. É tudo tão bonito que dá dó ver o dia clarear.
Aqui, não é só a igreja que é enfeitada para o natal. Tem uns prédios grandes que estão cheios de luzinhas penduradas num enorme fio. Dizem que lá se chama esplanada, ainda não entendi porque tem esse nome. Tem uns outros prédios de janelas azuis, com uns nomes esquisitos de outro mundo, que também estão enfeitados. Muita coisa eu ainda não estou entendendo, é tudo muito complicado.
Meus filhos, até as árvores da rua têm luzinhas piscando. É tudo muito bonito. Nem de longe se parece com a nossa Piracatuba que nem luz direito tem.
Vi, também, umas placas com nomes de lojas penduradas nos edifícios, brilhando que só, com as luzes coloridas. Falam que são “shoppings”. Tamanha beleza. Sem falar que perto de algumas pistas, na rua, tem uma televisão bem grande, vocês não imaginam o tamanho, que fica passando um filme colorido para os carros olharem. E a torre! Tem uma torre bem alta no meio da cidade, com tantas lâmpadas acesas que dariam para clarear a nossa Piracatuba todinha. Mas, o que mata é a saudade que estou de vocês todos. Tirando isso, eu mal consigo dormir de tão encantada que estou com essa cidade iluminada. Fico olhando um tempão, meus olhos até brilham com tanta beleza.
Quando o dia nasce, meus filhos, aumenta minha tristeza. As luzes são apagadas e a gente vê uma montoeira de carros de um lado para o outro. É gente que não acaba mais correndo para todo lado. E, tem uns meninos, do tamanho de vocês meus queridos, que a única luzinha colorida que eles olham é a de um poste que tem uma lâmpada verde, uma amarela e uma vermelha. Eles ficam esperando a luzinha vermelha acender para o carro parar, então eles correm e pedem dinheiro. É triste meus filhos, tem meninos assim em cada poste de luz colorida. São uns meninos magros, com as roupinhas rasgadas, sujos. Parece gente simples e pobre como a gente, mas eles tem uma cara muito triste. É de dar dó.
Vou terminando essa cartinha, para não amolar mais o moço do mercado que está escrevendo para mim. Não fiquem preocupados, mamãe vai arrumar um emprego e trazer vocês para cá para verem, à noite, as luzinhas coloridas do natal. Prometo que vocês não vão ter que ficar parados nos postes esperando a luzinha vermelha aparecer, e, quando a noite chegar, vamos ficar todos juntinhos abraçados olhando a luzinhas do natal piscarem.
Um beijo da mamãe.
Em Brasília, 16 de dezembro de 1997.