Cartas de Paris 13

Querido amigo,

A chuva cai penso em ti e na primavera deste encantador país.Vim passar pouco tempo. Deixei o mar da minha cidade que está bravio e insiste em avançar rompendo as barreiras, pouco se importando com os estragos que fará na bela praia.

A vida também é assim com a gente. Não mede as conseqüências e chega tirando de nós a juventude, a beleza e os sonhos. Mas eu, como uma rocha, tento resistir ao tempo e por isso quedo-me a escrever, elevando os meus pensamentos e relembrando uma bela e feliz estação das flores, quando perambulava pelas alegres e floridas avenidas de Paris bem mais feliz do que agora.

O mês também era maio e uma insistente chuva caía brincando de esconde-esconde com o sol. Deixei o pequeno Hotel da Rue des Écoles e fui caminhar pouco me importando com ela. Qual não foi o meu espanto quando vi pequeninos pontos brancos sobre a minha cabeça e à minha volta. Ah! Que deslumbramento, meu querido amigo, eram pontículos de neve.

De repente, tudo embranqueceu. Os carros, as calçadas e as pessoas com enorme guarda-chuva pontilhados de branco. Um encanto para os meus olhos de nordestina, acostumada à inclemência do sol. A sensação que tive e o desejo que me assolou naquele momento, foi o de sair dançando, à semelhança de um filme antigo que embalou a minha juventude.

Eu não sabia parar. Caminhava sem uma direção certa, enquanto as pessoas procuravam se abrigar. Quando passou o alumbramento, entrei molhada num movimentado café e pedi uma taça de vinho “bordeaux rouge”. A felicidade estampada nas minhas faces coradas chamava a atenção dos passantes. O mundo girava e eu, com o coração aos pulos, curtia as emoções da minha primeira visão da neve.

Ah! Que magnífica primavera. Em cada esquina, jarros com flores das mais variadas cores e cheiros. Uma multidão das mais diversas nacionalidades, cor e credo povoava as ruas da cidade. Foram duas semanas de total felicidade.

Estava livre, feliz e tinha um belo sol para me proteger. Aproveitei e fui conhecer os arredores de Paris, com seus castelos, igrejas, parques e tantas outras opções. Jamais vou esquecer o dia que passei no “Parc de la Villette” e fui ao “Le Géode” um cinema dentro de um globo que me fez retornar à distante infância. Depois almocei num pequeno e aconchegante bistrô e me deliciei com um vinho branco Sancerre, trutas e morangos. Que farra gastronômica!

No fim da tarde, assisti ao concerto de um pianista argentino, encerrando assim o mais belo dia de primavera que passei em Paris, cidade de todos os sonhos e pecados. Até mais e um forte abraço da amiga.

Ina Melo

Paris, Maio de 2000