Terra, 7 de dezembro de um ano qualquer

Caro Júnior, eis aqui a receita de um infeliz Natal, como você me solicitou.
Ingredientes: medo, preconceito, indiferença, mágoa, vingança, isolamento.
Quantidade e modo de fazer: tudo conforme o seu gosto, na ordem que quiser, misturando sempre durante o ano todo.

Agarre-se ao medo, por trauma ou comodismo, sem sair de casa para visitar amigos ou parentes. Não vá às festas, ao cinema, ao teatro, à biblioteca... Quando sair que seja somente de casa para o trabalho, do trabalho para casa. Tudo é muito violento e só assim você se protegerá da vida.
Bata
-se em preconceito num giro de 360 graus. Olhe ao seu redor e catalogue os negros, os alemães, os índios, os pardos, os pobres, os ricos, os ignorantes, os sabichões, os homossexuais, os heterossexuais, os vegetarianos, os carnívoros, os “zuzuis”. Ninguém presta. Só sobra você, o ungido!
Não se comova com pedintes, com a violência que passa na televisão, com as calamidades públicas e suas vítimas, com as crianças cheirando cola, etc. Afinal nada disso é com você ou com a sua família. Cada um que cuide de si. O único modo de sobreviver neste mundo cruel é sendo
indiferente.
Guarde no fundo do peito aquela mágoa tão sua, pois só você sabe o quanto sofreu. Tanto a mágoa das coisas da infância, quanto as mágoas da juventude e as atuais. Estas últimas então registre num diário com tinta indelével para nunca serem apagadas. Quem lhe fez mal uma vez, jamais fará de novo porque você jamais perdoará e muito menos esquecerá.
Por fim, mas não menos importante, misture tudo isso ao seu sagrado
isolamento.
Nada de fazer amigos novos ou cultivar os antigos, se é que é possível a você encontrar alguém amigo hoje em dia. Mantenha-se distante de tudo e de todos. Se você não sai de casa para nada, também não use o computador para futilidades como conversar com alguém ou conhecer pessoas. Fique na sua que é melhor.
Modo e tempo de servir: a desilusão, a falta de esperança, a frieza e muito mais serão servidos a você na noite de Natal, se estendendo por todas as noites ao voltar para a casa da solidão, que o habitará para sempre.

                                                           Papai Noel




Este texto faz parte do Exercício Criativo - Um infeliz Natal
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meriam lazaro
Enviado por meriam lazaro em 07/12/2009
Reeditado em 18/01/2011
Código do texto: T1964739
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