Cartas de Paris V

Querido amigo,

Retorno à França e no TGV que me leva a Rennes, lembro-me do nosso último encontro, quando me esperavas no Monte St. Michel. Estavas feliz de ciceronear um turista deslumbrada com o teu país de tantas histórias e tradições. Hoje, de volta ao mesmo local, como Proust, saio à procura do tempo perdido, se é que é possível reencontrá-lo. Desço na estação apanho um táxi e vou ao velho Castelo do fidalgo Gaston Lenotre, onde nos hospedamos. Lembras: a noite era fria e nos aquecemos de caldo de moules e vinho branco “Sancerre”? Que bela noite. Juntos a um grupo ruidoso de amigos com seus risos alegres e descontraídos, que só as pessoas felizes sabem ter, quebramos o silêncio daquele enorme Hotel.

Ao chegar, encontro o Senhorio simpático, quase velho e me apresento. Instantaneamente, ele me reconhece e pergunta por que estou só. Respondo que é por conta das contingências da vida, mas desejo passar alguns dias visitando a região. Ele avisa que o tempo começa a esfriar e quase sempre chove.

Não importa. Quero um pouco de névoas e sombras para abrigar a minha alma e meu corpo. Faço então um roteiro sentimental, visitando a velha Abadia, construída no século XIII, orgulho e uma das maravilhas da França. Deixo o Castelo. Faz frio e me abrigo sob um pesado mantô. Sinto fome e procuro o mesmo restaurante onde nos deliciamos com ostras e champanhe. Nada mudou, tudo permanece igual. Refaço o trajeto gastronômico, triste e solitária.

Assim é a vida. Estou feliz por retornar ao ontem, com as lembranças vivas da tua presença doce e suave. Com as faces coradas pelo vinho, vou passear nas alamedas em companhia do sonho etéreo e irreal. Volto para o hotel, durmo e te reencontro.

Ina Melo França/nov/04.