Cartas de Paris III

Meu querido,

Estou sempre voltando a esta encantadora Paris. Tenho certeza de que nunca vou me cansar de caminhar por suas ruas em qualquer época do ano. Faz mais de dois anos que não deixo a minha ensolarada cidade do Recife para enfrentar os ventos frios e brumas, tão constantes nessa época do ano. Eis que se apresenta uma oportunidade e não resisto.

Vou passando pelo tempo que me maltrata de todas as formas. Lembro-me bem de quando caminhava por essas mesmas avenidas, usando elegantes sapatos altos, cabelos soltos e esvoaçantes, faces coradas. A própria felicidade encarnada na mulher tropical, livre, leve e solta. Hoje, mais comedida, novamente só, retorno aos pontos tão conhecidos, fazendo um itinerário proustiano, onde a cada momento, eu me deparo com o ontem trazendo-o inteiro para o aqui e agora.

Vim para os jardins de Luxemburgo, entro no meu café preferido, perto da Fontana dos Médicis e sorridente, cumprimento o gordo e bonachão Mâitre que, atencioso, acompanha-me até a pequena mesa. Parece que somos velhos conhecidos. Sento e pouso as mãos marcadas pelo tempo sobre a colorida toalha, enquanto chega o cardápio. Não preciso ver. Dessa vez, para espanto do M. Dupuy, peço uma taça de champanhe e morangos. Está acostumado a me servir “bordeaux rouge”.

Observo as pessoas que passam apressadas, conversando, rindo, gesticulando. Parece que todos aqui estão correndo para algum encontro. Alguém, sobriamente vestido, com um chapéu caído sobre a testa cumprimenta-me acenando. Não sei quem é, talvez, tenha se confundido. Aí penso, todas as pessoas de meia-idade são parecidas. Não importa, ainda quero vir muitas vezes a este Café. Não tenho pressa nem hora marcada com ninguém, sou dona absoluta do meu tempo. Apanho um bloco e começo a fazer pequenas anotações.

Vim desta vez a Paris disposta a criar um roteiro sentimental para os amantes. Para isso, é necessário estar acompanhada de um bom vinho ou de alguém interessante. Faço uma lista dos lugares que pretendo revisitar nesses dias em que irei flanar por aqui. O telefone toca e uma velha amiga diz que soube da minha presença na cidade. Combinamos um encontro em Montmartre quando o sol se esconder.

Estou rindo e lembrando um outro fim de noite, quando cansados, sentamos nas escadas da bela “Sacré Coeur” com uma garrafa de Cidra na mão (o pequeno restaurante ia fechar e fomos postos pra fora). Que noite! Depois descemos e fomos dançar em Pigalle, não sei onde, mas que foi maravilhoso, disso tenho certeza e jamais esquecerei. Pois é, querido amigo, Paris é sempre uma festa para todos aqueles que são apaixonados por ela. Abraços carinhosos com sabor de champanhe e morangos da amiga.

Ina Melo. Paris/96