CARTA DO MEU FILHO DANIEL

Queridos pais:-

Que Deus os abençoe!

Tudo bem com vocês, certo? Recebi a carta e fiquei muito contente. Realmente, pai, aquela crônica (“Meninos, eu vi”) faz lembrar um pouco a minha situação. E são estas pessoas simples que sustentam, sem dúvida, a economia deste país, pois o trabalho pesado são eles que executam. E como a terra aqui é fértil! Há muito arroz, o que me fez lembrar de Anápolis. O arroz é plantado às margens do rio Doce, do rio Manhuaçu e de outros. Por falar em rios, estou vendo se consigo, num final de semana desses, ir pescar. Não conheço muitas pessoas, mas o pessoal da Prefeitura parece saber onde pescar. Aqui tem muita traíra, cascudo e lambari. Outra coisa que o senhor ia gostar de ver é a caça de rãs. A chuva finalmente aqui chegou e, segundo o motorista da nossa Kombi, elas devem aparecer nessas lagoas. Ele mesmo disse que pega rã, com os filhos. Falei que não conhecia a carne dela, mas o senhor sim.

Nessas “viagens” pela roça, até os postos de saúde, vemos alguns animais silvestres. Noutro dia vi uma perdiz, do tamanho de uma galinha. Devo ter “puxado” isto de você, pai, pois dá uma vontade de sair pelos matos caçando esses bichos. Se um dia eu for pescar, ou caçar perdiz, mando uma foto, pra fazer inveja ao “velho do Cedro”, ok?

Quanto ao trabalho, tudo bem. Nós estamos tendo que complementar a cesta básica paga pela Prefeitura, e como nosso salário estava indo embora com isto, fui (eu e as meninas) à Prefeitura, explicar a situação e negociar um aumento. Mesmo considerando a casa paga, a água, a luz, o transporte, roupa lavada e comida pronta, tudo isso não corresponde ao benefício social prestado à população rural e, ao meu ver secundário, porém, princípio primeiro para o prefeito, aos “louros” políticos que a Prefeitura ganha. Não foi difícil, então, conseguir o aumento. Aliás, ele não é ingênuo, e deve saber o quanto representamos e quão pequeno é o custo que somos frente a isto.

E a senhora, mãezinha? Fiquei muito contente com suas poucas, mas abençoadas palavras. Não se preocupe muito, viu? Seu filho está, assim imagino, dando conta do recado.

Quero vê-los em breve, estou pensando na data. Mando uma carta pra Tia Irene; por favor, entreguem-na, sim? Não se esqueçam de dizer que mando lembranças a todos (vô, vó, tia Marilene, etc.).

Escrevam sempre, gosto muito de suas cartas. Mesmo que seja um bilhete!

Um beijo saudoso do filho que os ama muito,

Daniel

P.S= Pai, há aquela última prestação de um livro que comprei na “Interminas”, e a duplicata ficou com o senhor, lembra-se?

-o-o-o-o-o-

Aimorés, 03/02/1995

(Missiva recebida do meu caçula Daniel, acadêmico de Medicina na ocasião, fazendo Internato Rural na cidade de Aimorés/MG).

RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 29/10/2009
Código do texto: T1893142
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