Cartas de Paris I
Meu Querido,
Não sei por quantas vezes estive nos Jardins das Tulherias, onde início hoje o meu roteiro sentimental por Paris. É quase primavera e o sol, aos poucos vai afastando as nuvens, invadindo de luz este belo recanto. Ao longe, uma borboleta rompe o casulo e sai numa vibrante mistura de amarelos, vermelhos e azuis, a voar em completa liberdade, assim como estou me sentindo agora: livre, feliz e sempre solitária.
Começo o meu passeio, por este recanto adorável. Depois irei percorrer cada lugar com os quais me identifico e, entre uma taça de vinho e um pouco de pão e queijo, estarei escrevendo esta carta. Sempre te recusaste a me acompanhar, talvez por ciúmes desta cidade que tanto me apaixona. Não importa: ela me basta e, igual aos pássaros, vou sugar o néctar das flores em cada um dos seus jardins, que tanto me encantam.
Estou com o mapa estendido na mesa e assinalo o meu roteiro: “Notre Dame”, “Louvre”, “Les Halles”, “Quartier Latin”, “Montparnasse”, “Marais”, os mesmos lugares de sempre, mas cada vez renovados. Esta é Paris, nada é igual. Vou me embriagar aos poucos com essa quase primavera, sentir o cheiro das flores, cada uma mais bela que as outras, oferecidas aos passantes em cada esquina. Tudo aqui se mistura. O novo e o velho, o rico e o pobre. Uma cidade onde você pode estender o corpo cansado nas margens do Sena e ninguém o incomodará. Este é o lugar do mundo, dos muitos que visitei, onde ser livre é um estado de espírito.
Vim assistir ao pôr do sol nas douradas colinas de Montmartre, onde passado e presente se entrelaçam. Em cada Café, jovens irreverentes e coloridos misturam-se com velhos e tradicionais franceses, alguns quase centenários. Deixo a “Place du Terte” e vou circular pelos néons de “Pigalle”, onde se vende a ilusão do amor, no apelo erótico do sexo. É excitante, reconheço. Penso em ti, e sei pelo que conheço da tua libido, irias gostar.
O vinho, as ostras, os deliciosos caldos de moules, deixam-me excitada e com saudades. Quando descer a colina, encerrando o dia, vou assistir a mais uma representação do “Don Juan”. Ele é o mesmo, desde tempos imemoriais – o eterno insatisfeito, à procura do amor. Do Teatro, volto para o Hotel. A noite esfriou e o vinho não foi suficiente para me aquecer.
Retomo a caneta e vou terminar esta carta. Depois da imersão na água com sais perfumados, estou quente e cheirosa, até isso em Paris é diferente: os perfumes aderem mais à pele. Lamento não estares aqui para, com tuas mãos quentes e macias, espalhares creme sobre a minha pele, percorrendo vales e montanhas do meu fatigado corpo. Retiro o roupão e me deito entre os lençóis, abraçada com os travesseiros, assim, talvez possas vir da distante Galáxia onde estás, aquecer em sonho, esta mulher louca de paixão por Paris e pelo amor. Beijos carinhosos da amiga, amante e amada. Ina Melo. Paris, maio/2000.