CARTA A UM JOVEM SUICIDA
In memoriam
Desprovido de sutilezas, comunico-lhe logo que anteontem você morreu. O fato de escrever esta carta já te anuncia que findaste.
Não, não chore por sua mãe. Sua carne vive. És incapaz de extremismos, tampouco eu o sou, pois habito dentro de você. Agora não mais, ejeto.
É de arrogância que escolhe o fim. Tenta o que é merecido, cabível, apenas a poucos. Sua escrita canhestra, não fosse sua arrogância que o faz pensar merecedor, jamais o leva ao auge do suicídio. Parodiaste o suicídio!
Nunca em sua existência ousou na coragem. Fosse gauche, farrapo, Dom Quixote... mas opta sempre pelo inseto, vive na burocracia que no fundo, como aperto, o impede de respirar. É covarde!
O que faço se sou espectro, alter-ego? Não me resta — e qualquer Deus que você creia livre-me de tal incumbência — não me resta salvá-lo. Seu íntimo, aqui corpóreo, é tão estúpido e inepto de sagacidade quanto tu.
Para utilizar de tuas idiotices: morre sem ser ultra-romântico, Lorde Byron capiau, em épocas de pós-pós-modernismo é velho sem sofreguidão! Se num dia de verão houvesse despido o português, teria uma chance numa terça de carnaval, mas novamente a carapaça de um inseto, resolveu vestir o índio que não grita em combate em teu peito, onde rebentou-se a fibra. Pobre de ti; de nós!
Direi sempre, agora que para mantê-lo a alguns escreverei os resquícios de quando decidiu pela morte: “renasço”. Sei, obviamente que sei que é mentira. O limbo te consome há mais de dez anos. Não te manterei existente, meus textos apócrifos dirão um pouco daquilo que nega, esconde e eu sei. Idiotices novamente.
Cobre suas vísceras, fecha a braguilha, cobre-se de pano para que alguma crença lhe aceite ou dispa-se todo, seja índio e procura alguma crença que lhe aceite por sua falta de pureza ou creme para que a morte se consuma.
É triste, pagão, é triste!
Fazem-me pouco sentido, mas as palavras que deixo são:
Meus pêsames!
ANTONIO MILITÃO.