Uma carta de amor
Gato Malhado,
Desde que estamos juntos, preciso lhe contar como ando me sentindo.
Desde que você entrou na minha vida, eu ando errando a mão, a dose, esqueço a receita do equilíbrio. O quanto uso das partes que brigam dentro de mim.
Desde que lhe amei pela primeira vez, eu me confundo, porque metade de mim, não tem medo e levanta os braços, na descida da montanha-russa, olhos abertos; enquanto a outra metade acha melhor enfrentar a queda com as mãos na barra, segurando forte, espremendo os dois olhos, fechados, desde o começo do percurso.
Metade prefere brincar na beira da praia, no raso, enquanto outra não vê problemas em pular dezenas de ondas e nadar onde a pequena bandeira vermelha, agitada pelo vento, avisa sobre o risco, sobre um possível afogamento.
Desde que lhe conheci, eu perdi a receita do equilíbrio. Uso a parte que não deveria na hora em que não poderia. Me confundo com duas metades que brigam dentro de mim.
Uma metade acelera na estrada, no momento da curva fechada, pé direito até o fim. Enquanto a outra metade freia, bruscamente, ao ver a primeira placa, seta torta, avisando sobre o perigo.
Há dois meses, eu erro a mão, a dose! Me confundo com o que devo usar. Porque metade briga, explode, enquanto outra se recolhe, quieta, debaixo da cama. No quarto fechado. No tudo escuro. Metade de mim grita, outra sussurra.
Tenho uma parte que acredita em finais felizes. Em beijos antes dos créditos, enquanto outra acha que só se ama errado.
Tenho uma metade que só conhece a mentira, a traição, tenho outra que só conhece a verdade.
Uma parte que precisa de calor, carinho, pés com pés. Outra que sobrevive sozinha.
Metade auto-suficiente, mas que depois de você , erra a mão, a dose!
Esquece a receita do equilíbrio, se perde.
Há dias em que uso a metade que não poderia. Dias em que me arrependo de ter usado a que não gostaria, porque elas brigam dentro de mim ... as metades. Há, por vezes, uma metade mais forte, outras ferozes. Há metades quase indomáveis. Metades que me fazem feliz!
Não deixar que uma mate a outra tem sido a minha luta diária.
Sua Andorinha sinhá