Do encanto. Do êxtase. E da saudade.

Já perdi as contas de quantas vezes recorri à caneta, porque dói não poder te ver, dizer, gritar, chorar na sua frente, ajoelhar e contar pra quem quiser ouvir, que te amo, que morro de saudades de você todos os dias. E isto não passa.

Lembro da sensação ao te ver naquele corredor... bem ao lado da porta de entrada. Cabelos escuros, rosto pálido, boca carnuda e avermelhada. Os olhos eram puxados, uma bela herança dos índios. Era o mais belo de todos, sedutor... encantador. Ninguém o conhecia. Era novo ali. As amigas corriam sorrindo me contar quando o viam na rua, porque riam da cara de boba que se afeiçoava no meu rosto.

A primeira vez que parei na sua frente, percebi seu olhar distante, inseguro, amedrontado. Me vidrava, encantava; me deixava louca pra desvendar seu ar de mistério. Quando nos encontramos, as pessoas pareciam ter sumido. Só me lembro da gente. Passei o dia seguinte todo à espera com o telefone nas mãos. Mas ele não tocou. E no final da tarde o coração batia ansioso, apertado. Cadê você?

Um dia cheguei no nosso cantinho, e você estava lá em cima, respirando fundo, camisa aberta. Parou, olhou pra baixo com cara de dúvida e eu acenei. Você fez o mesmo e soltou um oi baixinho com os lábios. Meu coração batia forte, e ah, aquele seu cabelo preto! Mas o carro quebrou, você não conseguiu voltar naquela noite e viajou em seguida.

Esperava lá todos os dias, por horas. Você não aparecia. "Quem sabe no dia seguinte"... e claro, você voltou.

Amava chocolate; resmungava a falta que sentia dos brownies. Ligava o som pesado, me pegava forte e com cuidado. Me tratava feito boneca. Podia ficar horas me olhando nos olhos. Adorava me assustar, e eu gostava disso. Gostava de tudo aquilo que os outros achavam estranho em você. Ouvir suas histórias, admirar sua coragem, suas experiências.

Sabe o que eu mais amava? A bandana amarrada no meio da testa, a paixão, o sotaque, a língua enrolada, o cheirinho de sabonete, o rosto e o ombro molhado de quem tinha preguiça de se enxugar direito depois do banho. A piscadinha sentado na poltrona. A seriedade que te tomava às vezes. A perna cruzada em mim. A maneira como me virava e me ajeitava no teu braço sem que eu mesma percebesse o que estava fazendo. De verdade, amava seu jeito atrapalhado de falar comigo, e quando soltava um psiu, porque eu estava falando muito e há muito tempo. Amava quando pedia uma mordida do meu picolé e acabava comendo tudo sozinho. Quando eu ficava ali, agarrada no teu peito, te olhando com cara de dó e tentando te fazer desgrudar os olhos da tv. De propósito, tomava um gole d'água, e outro gole, e continuava com os olhos pregados na tela; eu resmungava alguma coisa e só então você sorria, ria, gargalhava enquanto me enchia de beijos e repetia o quanto adorava "aquela minha carinha". Amava quando me chamava de gatinha, e quando ficava repetindo feito bobo que adorava o gostinho de cereja da minha boca. Amava seu jeans com chinelo, as camisetas velhas e a camisa xadrez.

Foi tudo no momento certo amor. "Algumas coisas não importam como ou onde acontecem, mas com quem". Mas o tempo foi pouco e, de repente, tínhamos apenas lembranças.

No começo não sentia nada ao certo, mergulhei em confusão. O desespero era tanto, o medo, a dor! Chorei até meus olhos não abrirem, até ficar anestesiada, incapaz de pensar, de agir. Fomos do tudo ao nada. A realidade passou a ser este vazio que doía forte no peito.

Meu amor, minha vida, se eu pudesse falar contigo por alguns minutos, olhar teu rosto, sentir tuas mãos! Ao me levantar toda manhã penso quietinha a falta que você me faz, e quando a ânsia é muita, tanta que nem cabe mais no coração, falo baixinho pros anjos que tá doendo a saudade, que o coração tá apertado, que te queria aqui.

E se tivesse direito a um só pedido, pediria que não deixasse perder em ti nossas lembranças. Da vista, da pista, do morro. Das luzes, da dança, do ritmo. Do gosto, do beijo, do toque e do aperto.