Ao meu filho

Hoje acordei com muita saudade do meu guri. Lembrei-me de que outro dia você falou sobre ele, sobre como cedia sempre para tudo e todos e chegou a dizer que jamais voltaria a ser como era antes. Confesso que ouvi isso com certa dor no coração. Na ocasião lhe disse que ceder em prol de outro por amor, amizade ou consideração não é desmerecedor. Tudo bem que também não podemos ceder sempre, mas isso só vamos percebendo com o tempo e acabando por saber dosar e administrar os momentos certos, quando devemos e quando podemos. Mas, o fato de ter sempre cedido, não o desmereceu. Pelo contrário, você sempre foi uma pessoa muito especial. Além disso, todos sempre te admiravam e diziam o quanto era um menino bom, responsável e educado. Todos adoravam conversar com você, diziam que apesar da pouca idade era muito maduro. Depois você cresceu mais um pouquinho, começou a namorar e continuou a ser aquele menino meigo, sincero, sensato. Olhava para você, no meio de tantas pessoas "importantes" e não via diferença nenhuma. Pelo contrário, você brilhava, porque soube se fazer respeitar e amar. E o orgulho pelo meu guri continuava dentro do meu peito. Aí você foi viajar!!! Foi difícil, muito difícil ficar longe do meu menino, afinal nunca havíamos nos separado por tanto tempo!! Foram muitas noites de choro, de vontade de te abraçar, de conversar com você, saudade dos nossos papos. Mas, ao mesmo tempo, também me orgulhava por você, com apenas 20 anos, já estar viajando pela Europa. Pensava que se estava lá é porque fez por merecer, reconheciam seu valor e gostavam da sua companhia. Isso me confortava e, apesar da saudade, sabia também que seria uma grande experiência de vida.

Quando estava para chegar, eu não via a hora de te reencontrar, de te abraçar, ter meu menino de novo nos braços.

Porém, outro dia, de repente, depois do seu comentário sobre ele, é que me dei conta realmente de que meu menino tinha ido embora. Quem voltou era um rapaz que estava se tornando um homem, com todas as qualidades ainda inerentes a sua personalidade, mas também com os defeitos inerentes a um adulto. Confesso que sinto saudades da pureza de sentimentos daquele menino, mas a vida de todos é assim mesmo: deixamos a fase pueril da infância, entramos na da rebeldia adolescente e depois partimos para a tão gloriosa do adulto. Aí é que surgem os problemas: justamente nessa fase é que nossos defeitos afloram, eles vêm junto com a afirmação de nossa personalidade. E ninguém, ninguém mesmo foge a essa regra.

Jamais vou esquecer você encostado na porta da cozinha falando aquela frase sobre o meu menino. Foi depois disso que fiquei pensando quando foi que vi o meu guri pela última vez. De repente, me veio à lembrança claramente uma cena: você acenando todo alegre para mim ao ir entrando na sala vip do aeroporto. Você sorria todo feliz, seus olhos brilhavam e eu fiquei ali, olhando-o até o último minuto, parada e com lágrimas escorrendo pelo meu rosto. Deve ser coisa de mãe mesmo, a tal intuição maternal. Chorava naquele momento e agora percebo que exatamente ali, “meu guri” estava acenando e se despedindo de mim.

Foi dolorosa essa conscientização! Por isso, agora, diante da constatação da real trajetória de nossas vidas, te peço perdão por qualquer frase dura que tenha lhe dito, se te magoei, se não compreendi essa transição.

O que posso fazer agora é pedir muito a Deus que sempre proteja o meu rapaz, que o ilumine, abençoe seu caminho e que o torne um grande homem. Sei que você ainda me dará muitos motivos de orgulho, mas te peço que jamais se esqueça daquele menino que existia dentro de você. E quando puder, de vez em quando o liberte um pouco. Sermos adultos o tempo todo nos torna extremamente duros e egoístas. Nunca mais o desrespeite, nunca mais o difame, porque, com todos os grandes e merecidos méritos, ele também soube ser GRANDE!

Te amo demais

Liliane Bodstein Cardoso
Enviado por Liliane Bodstein Cardoso em 20/02/2009
Reeditado em 04/03/2009
Código do texto: T1449149
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