CARTA DE UM ATEU
Ao iniciar esta carta, não sabia direito se devia realmente fazê-lo. Não sabia se devia agradecê-lo pela consideração e pela tentativa de me enviar uma mensagem que no seu entender é boa.
Esclareço que não tenho nada contra ninguém, nada contra você Frei, mas o cristianismo não me serve.
O cristianismo tem uma mensagem que parece ser boa, mas que em suas entrelinhas, e isso me custou muito a entender, é uma mensagem de negação da vida como ela é.
Esperar uma vida perfeita num além-mundo, lutar contra a nossa própria natureza, odiar o que vem do corpo, desprezar as mulheres, fora toda a horrenda história da igreja católica que torturou e matou milhares de pessoas durante muitos anos.
Sinto que se eu compactuar com o cristianismo estarei ratificando toda uma história de sofrimento para humanidade. Fora o sentimento de culpa que a religião judaico-cristã impõem a seus fiéis. O pecado original, o absurdo inferno, o lago de fogo e enxofre, os vermes que nunca param de roer... Excertos da bíblia que parecem filme de terror!
Diga-me Frei, para que tudo isso? Se existisse um Deus que se diz bom, por que ele condenaria suas criaturas ao sofrimento eterno? Nem as penas que os homens impõem aos criminosos são tão terríveis.
Repito: Não tenho nada contra o senhor, nada.
Não encare estes escritos como um desrespeito, pois não são. São apenas as confissões de um ateu que encontrou a paz em sua descrença, um ateu que fala das profundezas de seu coração.
Confesso que estou bem melhor sem o peso da culpa cristã. Aceito a vida com suas coisas boas e também com suas tristezas, depressões e seu inevitável caráter trágico. Amo a vida como ela é, com suas delícias e dores, sem subterfúgios no além.
Aceito a morte, a finitude, aceito a vida tendo ela como valor dos valores e sendo ela o sentido dela mesma. Tendo ela o sentido que eu construir, o sentido que eu quiser, sem dizer amém ou sim para quem quer que seja.
Sei que no fundo suas intenções são as melhores do mundo. Acredite, as minhas também são. Mas se para você o cristianismo é a melhor roupa, para mim é uma vestimenta inadequada e incomoda.
Mais uma vez, obrigado por me escrever. Fique à vontade para escrever quando quiser e o que quiser, não me incomodo, aliás, até gosto.
Continuemos nós, ateu e cristão, nesta estrada chamada vida, sedentos da impalpável quimera chamada verdade.
Grande Abraço!
Márcio