Hora a Hora
Sinto-me só, sobre as tristes honras da melancolia, em pausas de solidão que não terminam nunca, visualizando as horas que teimam em não seguir rumo, e eu fico aqui sobre um céu estático e um espaço isolado.
Estou tão cansada meu amor, cansada dos dias não passarem ou de seguirem rumo de forma igual, é como se tudo parasse no tempo destemido da saudade e me abandonasse nas forças do desespero. E tudo se repete! O ontem é igual a antes de ontem, e o hoje repete-se sem vergonhas, já sem esperança nos ares de mudança que as marés muito de vez em quando trazem.
Caio em mim e fico aconchegada nos meus braços, em vez de adormecer nos teus, e é assim que me apercebo do abismo que me circunda e em que tu não estás.
A falta que tu me fazes, e o que me sobra é um espectro teu, o que me deixa em estado louco, em mente absorvida para dentro, deitada numa cama negra com os olhos rasgados de lágrimas, envolvida na saudade que me deixas.
Nada me limpa as feridas, não desinfecta, não tem cura esta doença com o teu nome queimado no mais profundo do meu coração, na minha alma, de tudo o que ainda circula em mim, e me deixa como rastilhos de vida.
O meu coração ainda bate, apesar de cansado, bate em sonhos quando me surges, bate quando fecho por segundos os olhos e te sinto como um toque de mansinho que nos chega, numa espécie de aragem fresca, embora não haja vento, nem ninguém do nosso lado.
O meu sangue ainda corre, mas divaga por mim com a demora de um relógio que pára tantas vezes.
E eu, meu amor ainda respiro, porque tu o permites, porque o teu grito apesar de mudo me quebra o silêncio do sufoco.
Sinto-me só, e o que me resta não chega para me fazer sorrir.
Os meus olhos também estão sempre iguais, aos de ontem, aos do mês passado, são tristes, estáticos, e com reflexos da cor do céu no dia que me fugiste.
Como me fugiste, escorregaste-me das mãos, viraste-me a vida do avesso da noite para o dia, de uma hora para outra, com a força bruta de um relógio que bate e corre à velocidade da luz. Isso, naqueles tempos que me perdia em outros tempos, e te perguntava baixinho, porque passava o tempo tão depressa.
Isso naquelas noites, que ainda me aconchegava nos teus braços, me embalava num espaço só nosso e tu dizias: “O tempo passa porque os teus olhos são azuis, e como o mar vêm no tempo o infinito”.
Mas o tempo não é infinito, e nós somos simples mortais, vimos como vamos, sem saber como, e os meus olhos não são da cor da paleta das tuas tintas, não vêm cor, são hoje dois retalhos de saudade, abandonados ao desespero, aflitos à espera do parar definitivo do relógio, do coração.
E o mundo continua, egoísta como sempre, mais um nome que se foi, mais um rótulo fora de prazo, mais um numero digitado...
Neste tempo de coisas tristes, fico aqui anestesiada, à espera de um vulto com o teu toque, talvez assim eu volte a sorrir.