A Carta

Por: Egídio Garcia Coelho

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A Carta

Hoje com meus 49 anos de idade e casado ha 28 anos com quem me apaixonei aos 16 anos, posso afirmar que "A CARTA" foi responsável pelo meu casamento e porque não, pela vida dos meus três filhos, hoje com 24, 22 e 17 anos.

Em 1973, falar ao telefone, ainda era privilégio de poucos, principalmente para quem morava em cidade pequena e ainda vindo da lavoura.

A carta era então uma romântica ferramenta que fazia dos corações apaixonados um verdadeiro chorinho de acordes acelerados que chegavam a provocar a sensação de um múltiplo orgasmo.

Lembro-me de uma em especial que chegou trazendo uma reconciliação, após um mal entendido provocado por conversas truncadas pelo nervosismo de se falar ao telefone.

Vale ressaltar que nem todas as pessoas tinham coragem e conseguiam se expressar ao telefone e minha timidez, bem que atrapalhou bastante naqueles tempos tão próximos.

Eis que, trabalhando como office-boy, minha mais triunfante atribuição, não poderia ser outra, senão a de ir ao correio abrir a caixa postal da empresa e é claro, antes de tudo, mergulhar por entre as correspondências na esperança de receber uma carta de quem estava perdidamente apaixonado a uma distância de apenas 130 Kms que, muito significava para quem ganhava meio salário mínimo e mal se equilibrava numa de bicicleta monark de 6 marchas.

Quase indescritível foi a minha sensação, diante da tão esperada carta de reconciliação que chegou após duas prolongadas semanas de silêncio e angustia, já que tinha ainda em jogo, um bilhete mal escrito que dava uma dupla interpretação e poderia jogar por terra aquele namoro tão promissor.

Desde os primeiros encontros eu vinha me expondo abertamente com declarações amorosas e já havia perdido a conta de quantas vezes tinha dito ou escrito a tão conhecida frase "EU TE AMO" e como ainda não tinha tido o privilégio de, pelo menos formalmente ser correspondido à altura, me sentia com razões suficientes para depois do maldito telefonema, mandar o tal bilhete fazendo cobranças sem muita sutileza.

Com as pernas bambas, lembro-me ainda da dificuldade que tive para subir até o pátio da Igreja Matriz (São Paulo Apóstolo) no centro de Blumenau-SC, onde me dirigi para o chafariz que alimentava um tanque com carpas (peixes) avermelhadas e águas cristalinas. Sentado a ouvir os ruídos das bicas d’agua e após algumas profundas respirações, tomei coragem para então desdobrar “A CARTA” que a esta altura já estava aberta.

Joinville,............1973.

À

Egídio Garcia Coelho

R........

Blumenau-SC

Meu Amor!

O dia despertou do coração da madrugada, trazendo para o mundo um sol cálido como um beijo ardente de um irresistível apaixonado, e eu com muitas saudades de você, me pus a escrever na esperança de ainda merecer tua tão preciosa e amorosa atenção, para te revelar que do fundo do meu coração, brotou um sentimento que há muito eu vinha lendo e ouvindo, mas que só agora tive o privilégio de experimentar.

Sei agora que houve algum mal entendido quando falamos no telefone e sei também, quais os teus sentimentos por mim e quero retribuir tuas bonitas declarações, dizendo que talvez seja impossível pra você imaginar, quão grande está e estará meu sofrimento até chegar uma resposta desta carta que me levou a reconhecer agora minha necessidade de te dizer com as maiores letras do mundo que “EU TE AMO” e que também TE AMAREI por toda a minha vida.

Assim, .........

e seguiram mais dois românticos parágrafos....

Com todo o meu amor da sempre tua ...

ÁUREA

A introdução da carta, vim a saber mais tarde que veio de outro paquera de Curitiba que estava a querer na época, disputar naquele coração o meu espaço.

Pode, porém, ser plágio de algum livro de poesias ou algo semelhante, ficando assim, sem seus devidos créditos se for o caso. No que agradeço se alguém me puder ajudar, conhecendo quem me presenteou com tal preciosidade.

Sem menosprezar aqui a criatividade do meu rival.

Porém, foram as palavras desses dois parágrafos, que carrego comigo desde então por sobre a frase “ EU TE AMO”, sempre que a vejo ou escuto, podendo ainda acrescentar que minha paixão ainda hoje, é semelhante a daquele menino que muito tinha que aprender, sendo tal relato uma das mais brilhantes glórias que um ser humano pode experimentar e segundo o teólogo Leonardo Boff, foi “UM MOMENTO DE TRANSCENDÊNCIA.”

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