PERGUNTA EPISTOLAR ÀS POETAS ou POETISAS

Caras Poetas ou Poetisas, como prefirais:

Leio da vossa companheira em líricas e outras escritas, Rosália (ou Rosalia) (de) Castro, poeta galega (Compostela 1837-1885), um poema tremendo, que, sem título da autora, vem sendo conhecido por NEGRA SOMBRA (mantenho a grafia que ela utilizou):

Cando penso que te fuches,

Negra sombra que m’asombras,

Ô pé d’os meus cabezales

Tornas facéndome mofa.

Cando maxino qu’ês ida,

N’o mesmo sol te m’amostras,

Y eres a estrela que brila,

Y eres o vento que zóa.

Si cantan, ês tí que cantas,

Si choran, ês tí que choras,

Y-ês o marmurio do rio

Y-ês a noite y ês a aurora.

En todo estás e ti ês todo,

Pra min y en min mesma moras,

Nin m’abandonarás nunca,

Sombra que sempre m’asombras.

(Follas novas, “Libro II, Do íntimo!”, 1880,

p. 52, na edição original)

E pergunto-vos, a vós, que sabeis bem o que é a poesia, porquanto sois, antes que poetas, poesia incarnada:

Qual é o EU lírico no poema?

Será um EU, individualizado, íntimo, como diz o título do livro em que a inclui, a remeter à pessoa física da Rosália Castro, esposa de Manuel Murguia, historiador e arquiveiro, e mãe de seus filhos?

Ou será um EU abstrato, pretensamente a Humanidade toda, ensumida na angústia existencial, como se a poeta, contemporânea do Kierkegaard, traduzisse em poesia e para português galego o que o dinamarquês escreveu em ensaio e prosa no seu idioma materno?

Ou talvez seja um EU concreto, identificado com a Galiza, de que a poeta tanto se doía, ao entender, com toda a razão e argumentos, que estava preterida e abafada pelo “Reino de España”, até ao ponto de afirmar que não devia chamar-se “española”?

Pergunto-vos a vós, poetas ou poetisas, porque tendes sensibilidade e clareza suficientes para discernir e sobretudo porque, sendo cultoras da lírica, podeis com certeza e acerto colocar-vos no lugar de Rosália e interpretar adequadamente o que ela disse.

Obrigadíssimo pelas vossas reflexões. Recebei um beijo, também lírico, em correspondência.

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Comenta, em 29/09/2008 06h15, Iran Di Valença: «Senhor Agil. Bom dias. Saúde! És um hábil e sensivel vate das letras para pedir reflexão a autores do Recanto, quse 100% de amadores. Será ironia? rs.rs.rs.»

Depois de agradecer o comentário, respondo e explico:

1.- Não ironizo.

2.- Das poetas amadoras espero tanto ou mais do que os poetas profissionais.

3.- Porque antes de mais são mulheres e a mulheres, também poetas, dirijo a minha pergunta, aliás, livre de ser respondida.