Carta Aberta

Tenho oito anos de idade, e olhar para o céu é um ato comum em minha vida. Não para ver estrelas nem para empinar papagaio. Estendo as mãos pra convidar-te a me ouvir.

Sinto um calor que não é humano, e as balas aqui, não são doces não, elas queimam feito fel quando atingem meus amigos. Vi meu irmão caído, mas não foi apenas um tropeção, a fome o levou daqui! Estendo-te as mãos, suplico em preces e espero o avião com as bolas que caem do céu. Estendo-te as mãos. Me da mais alguns grãos, farinha, pão. Tenho sede; mande água, feijão.... Quero chegar aos vinte anos. Abrace-me, adota-me, antes que os urubus dividam com os restos de humanos, a minha carne. “Eles, os meus irmãos”. Chama-me de anjo, antes que eu desapareça ou seque até morrer nessa terra longínqua, onde o sol insiste em nascer.

Reúno as minhas ultimas forças para dizer-te estas coisas e dizer-te também, que aqui é triste demais. Quando morre um irmão, sentimos paz, pois sabemos que ele já não sofre, porém, o direito e a vontade viver dão-me forças pra continuar e pedir clemência aos homens de branco, e que olhem para baixo e nos vejam calejados até a alma. Que compadeçam enfim, e nos de a chance de mostrar ao mundo que somos humanos e que amamos. Também somos capazes de aprender e ensinar. Hoje é dia de negro é dia de branco, por favor, mate-me a fome e deixa-me sentir que posso. Quando me deixam. Sonhar!

Lili Ribeiro

27/06/08

L Leão
Enviado por L Leão em 01/07/2008
Código do texto: T1059306
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