Retrospectiva da vida recheada de sentimentos
Me peguei com a memória do meu notebook cheia. Pensei em restaurar, mas aqui tenho memórias, imagens que nem sempre me vêm à mente. Nem tudo é recordável sem um bom estímulo. Então, fui deletando alguns arquivos: contratos, orçamentos, gravações de tela, apagando imagens que não me remetem à nostalgia e, claro, não me trazem o sentimento de saudades. Não são relíquias das quais quero guardar. Em compensação, vejo imagens que me levarão a outras recordações, que sequer estão salvas na memória do meu computador, memórias que gostaria de transformar em vídeo, memórias do Leandro, como daquela vez que conversamos sobre pelos pubianos. Ele todo feliz porque tinha nascido um pelo no saco, enquanto o Almir, que era um mês mais velho que a gente, já tinha as axilas repletas de pelos. Haha, e são várias as memórias.
Sempre me policiei em fugir de sentimentos dolorosos. Sou do tipo que sofre ao extremo com a despedida, sofre demais com a distância, sofre demais com a quebra de um acordo. Então, me policio, vigio meus atos e possíveis gatilhos que possam me levar a ter sentimentos por alguém, que me levem a amar alguém, e isso não é bom. Isso faz de mim um covarde, e não é uma pergunta!
Sempre tive esse romantismo enraizado. Sempre cobri o rosto quando via alguém se beijando, mesmo na televisão. Ainda sinto essa emoção, mas não cubro mais o rosto. Me emociono com finais felizes, sonho com meu final feliz. Esse é meu maior desejo. Tanto que, certa vez, me senti tão realizado e sabendo que tinha algo ruim por vir, desejei a morte. Desejei e até orei pela morte, pois ela deixaria meu filho com um belo retorno do meu seguro de vida. Até então, deixaria minha esposa com outra parte bem também. Até então, éramos marido e mulher, e isso para mim é um final feliz. Mas desejei tanto a morte que caí em depressão. Sai de casa desejando a morte, tanto que atraía problemas e situações ruins. Fiquei uma pessoa negativa, pessimista, mesmo declamando o amor, a compaixão. Mas estava amargo, desconfiado, limitado à mediocridade dos maus.
Gosto de finais felizes, desejo um final feliz de alguma forma para todas as pessoas. Sempre tento ver a partida da minha mãe como um início. Minha mãe se foi numa madrugada, mas ela me esperou para vê-la pela última vez. Esperou eu dizer “Eu Te Amo” pela última vez. Consegui ouvi-la me dizendo “Eu Te Amo” pela última vez.
Eu sabia que seria assim, e é uma história de puro sentimentalismo. Não me recordo do dia da semana, mas eu e minha equipe fazíamos a reforma dos galpões de uma multinacional da Itália, fábrica de máquinas de café. Ao voltarmos do almoço, já senti um aperto e vontade de chorar. Coordenei o pessoal para retomar os serviços, enquanto eu procurava um canto para poder derramar minhas lágrimas, com aquele peso de culpa em relação à minha mãe. Estava trabalhando muito e não conseguia tempo para visitá-la no litoral. Minha obra, os galpões, ficavam todos no Bom Retiro. Um contrato que me colocaria e me deixaria bem por anos. Mas senti essa culpa e liguei para minha irmã. Ela me disse que não sabia se minha mãe conseguiria viver mais um dia. Não me recordo das palavras, mas aquilo pesou, e não quis acreditar. Mesmo assim, eduquei meu filho da seguinte forma: "Na dúvida, faça, sabendo que não é algo mal, que aquilo terá o poder de aliviar o seu coração. Faça". Então, mandei minha equipe sair do telhado correndo. Eu queria ir para o litoral e não podia deixá-los sem supervisão. Na época, eu era o técnico de segurança do trabalho nas minhas obras. Então, teria que levá-los até Guaianazes, voltar para Itaquera, pegar minha esposa e filho, e ir para o litoral ver minha mãe. No trajeto, falei para eles: “Não vai dar tempo, vocês vão ganhar o dia de vocês e vão poder entrar no mar. Vamos direto para o hospital onde minha mãe está internada, na Praia Grande.” E foi o que fizemos. Chegando ao hospital, faltavam cinco minutos para acabar o tempo de visita e não me deixavam entrar. Não lembro como consegui entrar, mas foi o tempo mais eterno da minha vida. Consegui ver minha mãe lúcida, que, mesmo em um estado péssimo, conseguiu estar bem e satisfeita com o que estaria por vir. Totalmente consciente de que agora poderia partir. Tivemos o momento de sabedoria e entrega de amor fraternal. O amor materno me deu a honra de entender melhor o sentido da vida. Me deu, em retrospectiva, todas as vezes que fazia sol e ela me mandava usar guarda-chuvas, me avisava sobre as pessoas com quem eu trazia para perto. Minha mãe, todos os dias da vida dela, me amou e se preocupou com meu bem-estar, meu futuro, e fez o mesmo com meu filho. E sei que essa não é uma história de final feliz, pois foi o início para minha mãe. Ela estava feliz, se foi realizada, seus filhos bem e trabalhadores, seus netos bem e saudáveis. Aquela era, sim, a melhor hora de partir feliz, com a consciência de que fez um ótimo trabalho, com a certeza de que seu legado seria mantido. E é mantido, pois busco estar bem todos os dias por ela. Busco proporcionar felicidade para todos à minha volta todos os dias por ela. Uso toda educação que ela me deu, uso todo conhecimento que me foi herdado. E, por isso, compartilho aqui o link de um de seus textos, claro que meu ego me pede para compartilhar o que é direcionado ao seu filho mais amado. Haha: link do texto.
Minha mãe, minha rainha, maravilhosa. E esse texto não é sobre ela, nem sobre o Leandro, ou sobre tantos outros que guardo em arquivos, mas que não poderei fazer novos. Não terei novas imagens, mas ainda tenho novas imagens. Pois sonho, trago para o surreal e vivo discussões, levo broncas e, graças a Deus, acordo quando estou prestes a apanhar.
Sentimentos, coisas boas. Aqui não há tristeza. Mesmo que você comece a chorar lendo este texto, te garanto que essa é a primeira vez que escrevo a palavra “mãe” sem chorar. Mas, haha, não é sobre tristeza. É sobre eu, sobre mim, sobre aquele Danilo, hoje mais sábio que ontem, mesmo sabendo que ontem meu teste de QI deu 113, 16 a menos que no ano retrasado, 10 a menos que no ano passado. E tenho percebido o esquecimento. Tenho reparado que não me recordo de muitas coisas. Sequer me recordo das coisas que escrevo, sequer me lembro de rostos recentes.
E pelo pouco que busquei de textos antigos não publicados, que achei melhor apagar, fui muito depressivo. Inclusive, se você ler este texto e encontrar o texto onde deixo subliminarmente minha oração desejando a morte, me mande o link. Não quero ler e não quero que isso possa ser um gatilho.
E, retomando meu raciocínio de ser e estar feliz: sou e estou feliz. Estou de bem com a minha vida, inclusive com a mulher que me deu minha maior riqueza, que preencheu lacunas de infelicidade com felicidade e orgulho. Hoje posso chamá-la de amiga, mãe do meu filho, uma mulher que, um dia, chamei de amor da minha vida. Em um momento, lhe pedi em casamento e ela me disse “sim”, enquanto minha mãe disse “não”. Então, elaboramos um plano, que chamo de “Romeu e Julieta”, onde, claro, um ser como eu, que na época deveria ter um QI de uns 150, apenas a convenci de engravidá-la. E o bom de quando a gente se ama é que topamos tudo aquilo que quem amamos aceita. Claro que ela recuou um pouco, pois teria que largar os anticoncepcionais e eu, a camisinha. Foram tantas tentativas satisfatórias, tentativas em todas as luas, em todos os sóis, para rimar: houve diversas e diversas trocas de lençóis.
E então:
“Dan, acho que minha menstruação está atrasada…”
Não pensei muito, coloquei ela no meu Corsa GSi 1.6 16v rebaixado, com rodas 15 cata vento, pneus perfil baixo, corneteira Selenium Titanium com dois subwoofers Rockford Fosgate, 2 módulos Rockford Fosgate, kit triaxial portas e tampões da Pioneer, bateria de 70ah, filme Shark chumbo, aerofólio da Magaof, e fomos comprar o teste de gravidez. Já estava emocionado, pois já haviam se passado sete meses desde minha proposta. Cheguei a chorar e a orar: “Pai, eu amo ela. Quero ela como minha, quero ela pro resto da minha vida. Eu desejo, sempre desejei um filho. Esse é meu maior sonho. Me ajuda a ser fértil, me ajuda. Não posso ser estéreo, por favor, me ajuda a realizar esses sonhos.”
Bom, comprei o teste, fomos para minha casa, que na época ficava em Guaianazes. Peguei um copo vermelho, que sempre ficava perto do filtro, e disse para ela: “Mija aí nesse copo o que der para mijar.” Meu tio estava na sala, de frente para o hall e o banheiro, então falei: “Você vai ter que ir sozinha.” Ela disse: “Eu mijo e você faz o teste.” Ela saiu e me deu o copo quente, de chá, onde mergulhei o teste, e logo deu positivo. Não parei de chorar. Meu tio, na época, deve ter pensado que minha hemorroida tivesse explodido. Kkkkk. Então, balancei a cabeça para ela de forma positiva, mudei meus planos, pois, na época, estava dividido entre trabalhar com meu pai na Engenharia da Igreja Universal ou continuar como o melhor instalador técnico da DirecTV na Jet Sat em Moema. Decidi trabalhar com meu pai por alguns anos e depois fazer algo que me ajudasse a zelar pela minha futura esposa e meu bem mais precioso, e investir em conhecimento e em um negócio que eu ganhava dinheiro brincando: montar som de carro aos finais de semana. Vendi o Corsa, montei minha loja, mas algo aconteceu que prefiro não relatar. Depois de ter dado muito certo, acabei voltando com meu pai para a Engenharia da Igreja Universal.
Como disse, hoje somos amigos. Não tenho inimizades e resolvi fazer da minha vida uma boa história. Isso demorou muito, pois sempre tive um temperamento estourado e cheguei a ser temido em muitos lugares. Cheguei a ter problemas com a justiça, por invasão, agressão. Alguns caloteiros têm medida protetiva em relação a mim até hoje, e por isso agora levo tantos calotes.
Mas este texto é sobre as minhas memórias. As memórias que os arquivos que estou apagando não serão ditas aqui, ainda que este talvez se torne meu melhor resumo da vida. Bom, da vida até aqui, tipo hoje, com meus 44 anos de idade, meu filho com 22 anos, mais de dois anos separado, mais de 10 anos sem a presença física da minha mãe. E essa é a melhor versão de todas as crenças. É a única que faz sentido. Mesmo que você acredite que Deus possa te criar um inferno para que você seja queimado pela eternidade, que você sofra a dor da picada de milhares de escorpiões, que sofra a dor da fome, coma e sua fome não seja saciada, que você sinta sede, beba e sua sede não seja saciada, que você tente se matar, mas ainda assim não morra, mas sinta a dor da morte, eu prefiro acreditar que Deus é bom e que não criaria esse inferno.
A fé é o meu refúgio, e posso falar um pouco sobre a fé, ao menos com base nas minhas passagens por algumas religiões, algumas fraternidades, e por que não, por algumas seitas. Mesmo que me digam serem satânicas, todos temem a Deus e falavam muito bem dele.