O livro
A decisão já estava tomada. Não havia a opção de retorno. A questão era de sobrevivência. Lá estava eu pela primeira vez enfrentando uma metrópole. A meta era começar a conhecer a cidade que me daria guarida nos próximos dias, pelo menos. O destino era o centro da capital do Rio Grande do sul: Porto Alegre. Um grande desafio para quem estava iniciando uma nova proposta de vida.
Estava no centro de Porto Alegre. Tudo era novidade. Os prédios, os carros, as pessoas. Eram aos milhares. Oh, quanta gente! As pessoas transitavam aos lotes num vai-e-vem como se não houvesse nenhuma dúvida onde elas queriam chegar. Não era o meu caso.
Passado o impacto das primeiras novidades, involuntariamente, o meu cérebro começou a pensar e fazer perguntas. As dúvidas e os medos começaram a fazer-me companhia. Todas aquelas pessoas não evitaram a sensação de sentir-me só. A sensação de solidão era tão grande que deu oportunidade para que o medo se instalasse na minha alma. Comecei a sentir as pernas cansadas. As perguntas não cessaram. O meu cérebro tentava de todas as formas elaborar respostas, mas elas não surgiam.
Pensei em fugir daquele panorama hostil, quase que insalubre. A coragem inicial deu lugar a um carrossel de dúvidas e medos. O meu cérebro fervilhava completamente improdutivo, pois não elaborava nenhuma resposta que pudesse dar-me um norte razoável.
A cidade perdeu seus encantos. Acalmar o meu espírito passou a ser mais importante. Eu precisava voltar a coordenar os meus sentidos. Necessitava de respostas. As circunstâncias levaram-me a pensar em ajuda. Mas que ajuda, onde? Eu estava só, não tinha conhecidos próximos.
O cansaço já era companheiro do meu corpo. Tive mede de não reagir. A cidade já não era importante. A luta era entre eu e as minhas perguntas sem respostas. Numa tentativa quase que desesperada tentei pensar novamente. Os estímulos eram fracos. Briguei com minha vontade, provoquei-a. Lentamente comecei a voltar para a minha nova realidade: a realidade onde eu teria que sobreviver. Tênues reflexos de lucidez começavam a me deixar enxergar os objetos e coisas que me cercavam. Subitamente tive o primeiro reflexo saudável: pensei numa leitura que amenizasse todo aquele estado de angústia. Pensei num livro. Mas quê livro?
Eram muitas as livrarias. Bem maior era o número de livros expostos nas vitrines das mesmas. Meus olhos percorriam todos os livros. Os títulos passaram a ser o alvo. Havia livros com os mais variados títulos, cores e preços?
As minhas pernas reclamavam. O cansaço sugeria que parasse e descansasse. Mas, os meus olhos, contrariando as circunstâncias, continuavam a fotografar e mandar mensagens para o cérebro. Um estímulo especial me fez parar, sobre um tablado de madeira crua estava repousando um livro de capa azul, onde podia ler o título e o autor: O dilema Humano, autor: Rollo May.
Levei a mão à maçaneta da porta e entrei. Decidido caminhei em direção à vendedora. Após tê-la cumprimentado, apontei para o livro dizendo que queria vê-lo. Após tê-lo folheado e examinado troquei meia dúzia de palavras com a vendedora e comprei o livro.
Esqueci do mundo e do cansaço e fui logo lendo aquele livro, como se ali tivesse as respostas que o meu cérebro não tinha me dado. O livro era uma literatura de psicologia onde associava o dilema humano e princípios de psicanálise. À medida que ia lendo aquele livro comecei a relaxar, o que não sei se pelo seu conteúdo ou pelo novo foco da minha atenção.
No dia seguinte a nova realidade já não me causava tanto impacto.
profissionaisgestaohospitalar@gmail.com